Avenida Central

"Temos Ali Um Cancro"

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tadimneve
© Dario Silva, 09-01-2009. Neve na Estação de Tadim.

Tadim, 47 km a montante de Porto Campanhã, é um ponto da recta imaginária que liga Porto a Braga, logo realidade indissociável tanto do Porto como de Braga. A Linha do Minho e o Ramal de Braga são uma das consubstanciações físicas de uma rede perceptível de ligações afectivas, de fluxos, tanto de gentes como de ideias, que queremos cada vez mais forte.

"Temos Ali Um Cancro" Ou Carta Aberta à Junta de Freguesia de Tadim
Foi mais ou menos com estas palavras, e sem conseguir fugir ao sentido mais negro e temerário que as mesmas conseguem transmitir, que José Manuel Cunha, presidente da Junta de Freguesia de Tadim, se referiu recentemente à secular estação ferroviária da freguesia a que preside há 24 anos.

O feito aconteceu no passado dia 8 de Outubro num comício da campanha eleitoral, dias antes da sua reeleição para mais um mandato à frente da instituição que melhor representa os interesses e vontades e riquezas da freguesia.

Pese embora eu não ter estado presente nesse comício, assumo que o presidente da Junta (re-candidato) se estivesse a referir concretamente ao Edifício de Passageiros (EP) da estação ferroviária que serve a terra desde 1875. Portanto, 134 ao serviço de Tadim e do Vale d'Este.

Ao referir-se àquele edifício nestes termos, José Manuel Cunha não deve estar ciente - ainda - do valor efectivo, afectivo e patrimonial da nossa estação. Eu explico.

Nos idos de 1872, quando se iniciou a construção do Ramal de Braga (e a odisseia ferroviária a norte do Douro), não se ponderava a construção de nenhuma paragem intermédia. Quando os comboios começaram a passar, já em 1875, Tadim tinha uma estação ferroviária. Reza a história que um ilustre tadinense de então - Luís Braga da Cruz - intercedeu positivamente para que a sua terra fosse servida pelo comboio. Assim, é de justiça dizer-se que aquela estação, aquele singelo edifício, é também um património conquistado e legado por um homem da terra, um tadinense.

Os Blogues Como Instrumento de Cidadania

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«Ao enterrar o trânsito em toda a extensão da Avenida da Liberdade, aumentava-se ainda mais a área pedonal, criando um eixo desde o centro medieval até à zona da Ponte. Com uma solução deste tipo, evitava-se a existência de uma única boca de saída do tráfego, distribuindo-o por várias saídas ao longo do trajecto do túnel e permitia-se a ligação directa entre o Parque da Ponte, o Parque de Exposições e o Monte do Picoto, onde haveria de nascer o grande, desejado, eternamente adiado e persistentemente prometido "Parque da Cidade".»

Este excerto foi escrito há quase um ano na sequência de um texto publicado no extinto blogue "Arcada Nova". Pelos vistos, a ideia agradou ao actual Presidente da Câmara Municipal de Braga. Este caso é mais uma evidência da importância da blogosfera enquanto instrumento de participação cidadã na vida das comunidades locais.

Petição pela Cinemateca em Braga

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cinemateca lisboa a
© mundokino

O Público dá conta da petição que promete mobilizar os bracarenses e minhotos ao longo dos próximos tempos. Sabendo da intenção de abrir três salas de um pólo da Cinemateca no Porto, «um grupo de cidadãos de Braga quer que a cidade tenha direito a receber "um pólo ou subpólo" da Cinemateca, onde serão exibidas "obras antigas e filmes contemporâneos fora dos circuitos comerciais"

A iniciativa partiu de Manuel Caldeira Cabral, docente de Economia da Universidade do Minho. Para a justificar, Manuel Caldeira Cabral afirma que «neste momento, está a pensar-se descentralizar a Cinemateca para o Norte, numa medida que aplaudimos, mas se estão previstas três salas para o Porto, porque não considerar uma sala em Braga? Em vez de três salas com dois quilómetros de distância, teríamos uma a cerca de 50, para um outro público

O blogue Avenida Central adere à iniciativa e apela à participação de todos, assinando online aqui ou na Centésima Página, Velha-a-Branca e Universidade do Minho.

Do Referendo [2]

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Caro António de Almeida, concordo que o afastamento entre eleitos e eleitores é altamente preocupante, viciando de forma determinante a qualidade da nossa democracia. No entanto, convém lembrar que esse divórcio, sem culpa, se fundeia nos recantos mais profundos da idiossincrasia do povo português e que para o conhecer e explicar talvez tivéssemos que ir aos tempos em que noutras terras se começou a ler e a interpretar a Bíblia enquanto que aqui se ía acreditando no que outros liam e interpretavam.

Não sou, por princípio, avesso aos referendos. Contudo, não tenho outro remédio senão sê-lo em Portugal dado o desapego dos cidadãos à cidadania. Nesta matéria subscrevo António Amaro das Neves quando diz que «o que o país necessita é de cidadãos participantes

Orçamento Participativo 2009

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A Câmara Municipal de Braga lançou a edição 2009 do Orçamento Participativo, convidando todos os bracarenses a participar no site Braga com Todos. Segundo o Presidente do Município, a iniciativa pretende «reforçar a participação dos cidadãos na definição de prioridades para o contínuo desenvolvimento da qualidade-de-vida no concelho

A iniciativa é muito positiva, mas para que se assuma como estruturante, serão necessárias três garantias: 1) a garantia de que os contributos serão efectivamente relevados na elaboração do Orçamento de 2009; 2) a garantia de que os dados serão apresentados com total transparência, divulgando-se integralmente o conteúdo das participações; 3) a garantia da veracidade dos dados tornados públicos, onde se incluiu a garantia de que os sindicatos de interesses na submissão de contributos foram devidamente vetados.

Cumpridas as três premissas enunciadas, o Orçamento Participativo será uma mais valia para a consolidação da democracia e para o incremento da participação cívica da sociedade civil na tomada das decisões mais importantes para o futuro do nosso concelho.

WWW.BRAGACOMTODOS.NET
:: Município de Braga
Orçamento participativo na net :: Correio do Minho
El Ejemplo Inovador de Braga :: Morrazo Tribuna
Lançamento do Site do Orçamento Participativo :: RUM
Orçamento Participativo :: O Futuro Passa Por Aqui

Carta Aberta aos Deputados Eleitos por Braga

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Respondendo ao repto lançado pela iniciativa Parlamento Global, acaba de ser publicada a minha contribuição para a secção «Visto do Norte».

Começo por saudar a iniciativa Parlamento Global, enaltecendo a importância da comunicação entre os eleitores e os eleitos para que a sobrevivência do sistema democrático actual. Importa também salientar o interesse que alguns deputados eleitos pelo círculo de Braga têm dedicado à causa e discussão públicas, disponibilizando-se para contribuir para o debate que se faz na blogosfera minhota. Aproveitando a oportunidade que nos é dada, gostava de colocar aos deputados eleitos pelo círculo de Braga algumas questões muito concretas:

1. Por que motivo os preços por quilómetro cobrados na A11 e na A7 são superiores aos praticados nas outras regiões do país?

2. Por que motivo bracarenses e vimaranenses pagam as circulares urbanas das suas cidades enquanto noutros locais os utilizadores estão isentados desse pagamento?

3. Por que motivo o Orçamento de Estado comparticipa os transportes públicos de Lisboa e do Porto, discriminando todos os utentes do resto do país e, em particular, da região do Minho?

4. Por que motivo continua por avançar a linha ferroviária entre Braga e Guimarães, sedes dos 1º e 2º maiores concelhos do país extra-áreas metropolitanas?

5. Por que motivo Braga continua fora do mapa das cidades com eléctrico moderno ou metro de superfície?

Democracia Participativa, por Ricardo Rio*

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Da Participação na Democracia à Democracia Participativa

Quantos dos cidadãos de Braga se encontram recenseados na sua Freguesia de residência?
Quantos participam, votando, em cada acto eleitoral?
Quantos conhecem os seus representantes em cada um dos órgãos autárquicos?
Quantos cuidam de se informar sobre os vários actos da gestão autárquica ao nível Municipal ou da Freguesia?
Quantos emitem (ou têm) opinião sobre a forma como os seus destinos são conduzidos nestes patamares de Governo?
Quantos formulam sugestões para a melhoria da condução das políticas municipais? Ah, certo, 5.500…

Descurando o aprofundamento dos conceitos de ciência política - já aqui avisadamente explanados por muitos dos anteriores contribuintes, sou dos que defendem o aprofundamento dos “mecanismos democráticos” que apelem a e possibilitem um envolvimento crescente dos cidadãos na vida da Polis, escrutinando e enriquecendo as opções e os actos dos seus representantes eleitos.

Acho que tais iniciativas, profusamente aplicadas já um pouco por todo o mundo, e que vão muito para lá dos meros “Orçamentos Participativos”, nem traduzem uma diminuição da soberania de quem decide, nem muito menos consumam um acto de “folclore mediático” sem benefícios visíveis para o conjunto da Comunidade.
Não podem as Opções do Plano beneficiar com reais contributos de um leque alargado de cidadãos e instituições? Não deverá uma intervenção de fundo numa zona central da cidade ser alvo do confronto de ideias e propostas por parte de especialistas e cidadãos anónimos? Não deveria ser escrutinada pelo voto popular a decisão de alienação a privados de parte considerável do património de uma cidade?

Ainda assim, como em tudo na vida, há que não descurar o essencial em benefício do acessório.
Não se deve almejar muito em termos de Democracia Participativa quando são cada vez mais ténues os sinais de vitalidade da Participação Democrática (fenómeno para o qual este blogue é um positivo antídoto).

Mas, gostaria de frisá-lo, não se pode desvalorizar o papel que numa e outra vertente cabe aos Partidos Políticos e à militância partidária.
Ao contrário do conveniente “bode expiatório” para os males da Democracia em que se transformaram estas estruturas, os Partidos continuam a ser no actual e único regime possível um pilar da Participação Democrática. E, acrescento, qualquer análise minimamente séria e descomprometida revê em qualquer outra esfera da sociedade, das empresas, à administração pública, às universidades, a cada colectividade de bairro, os mesmos exemplos positivos e negativos que marcam a sua actividade.
Daí que, ao invés de se verem como sucedâneos, os movimentos de cidadãos devem ser entendidos como complementos à esfera partidária, com contextos de actuação, objectivos e instrumentos necessariamente diversos, sob pena de poderem perder a sua própria identidade genética.

Tinha 16 anos e estava a acabar o liceu quando me inscrevi no PSD, no dia seguinte à mais copiosa das derrotas de Cavaco Silva numas Eleições Europeias.
Da militância anónima à integração numa Comissão Política do PSD local, já licenciado em Economia e com uma exigente vida profissional no Porto, passou quase uma década.
Desde 2002, lidero o PSD de Braga, fui candidato à Câmara Municipal de Braga em 2005 e voltarei a sê-lo em 2009, com absoluta confiança na vitória mas com o mesmo fito que determinou toda a minha Participação Democrática: dar o meu melhor para servir Braga e os Bracarenses em vez de esperar que outros o façam por mim.

(*) Presidente da CPC do PSD Braga e autor do blog Braga2009

Democracia Participativa, por Ricardo Gonçalves*

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Democracia Participativa e Democracia Representativa

Muito se tem falado ultimamente de Democracia Participativa e de Democracia Representativa. E há que fazer uma distinção correcta entre estes dois conceitos, que tantas vezes, certamente por ignorância, se confundem.

Na Democracia Representativa, o eleito representa o seu eleitorado mediante um compromisso que foi assumido na altura da campanha eleitoral, compromisso que então estabelece com os seus eleitores.

Na Democracia Participativa, o cidadão ou eleitor participa directamente numa decisão, mas com a particularidade de ter um poder vinculativo.

É o que acontece, por exemplo, com os referendos. Há uma proposta e há uma votação num determinado sentido e é a maioria dos cidadãos que decide, sendo que será essa a decisão que prevalecerá. Este é o exemplo mais flagrante da Democracia Participativa, em que o eleitor decide directamente e vincula com o seu voto.

Será curioso – ou até mesmo importante – citar aqui o caso da Suiça. Os suiços são governados há décadas por executivos de coligação e nos assuntos mais delicados os cidadãos são chamados a pronunciar-se em referendo. Neste contexto, pode dizer-se que a Suiça é governada por uma Democracia Representativa e por uma Democracia Participativa.

Mas já não se pode falar de Democracia Participativa quando, por exemplo, uma Câmara Municipal lança o desafio aos seus munícipes para se pronunciarem e apresentarem sugestões para a elaboração de um Plano de Actividades. Sendo de louvar uma iniciativa deste género – como ainda aconteceu recentemente com a Câmara de Braga -, o facto é que não se trata verdadeiramente de uma Democracia Participativa, antes o recolher de contributos que os responsáveis, sejam eles quais forem, irão depois acolher para a elaboração de tal documento. Neste caso – e, repete-se, como muito bem aconteceu com a Câmara de Braga -, trata-se de reforçar a Democracia Representativa.

Naturalmente que, em Portugal, ainda estamos longe de consolidar e juntar estes dois tipos de democracia. Estando implantada a Democracia Representativa, podemos dizer que neste momento estamos a avançar para a consolidação da Democracia Participativa. O que, como é evidente, num futuro próximo, só valorizará ainda mais a sociedade portuguesa.

Mas infelizmente, os referendos que se realizam em Portugal não tiveram grande adesão e o que é custoso é que nas sondagens em que se pergunta às pessoas se querem um referendo sobre um determinado assunto, a grande maioria responde que quer um referendo mas quando estes se realizam essa mesma maioria não vai votar. Isto demonstra que o povo também tem que meter a mão na sua consciência política e assumir que a democracia exige um empenho diário, forte e pessoal, essencialmente quando queremos casar as duas democracias em causa para enriquecermos o funcionamento da nova sociedade.

(*) Deputado do PS eleito por Braga

Democracia Participativa, por Luísa Teresa Ribeiro*

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Se um jornalista sair à rua para ouvir a vox populi e pedir às pessoas para definirem o que é a democracia, estou convencida de que a maioria, depois de um momento mais ou menos prolongado de embaraço, falará da liberdade de dizer o que quiser e de poder votar. Se o jornalista insistir, numa segunda etapa, começarão os lamentos em relação aos políticos, que são todos iguais e que estão lá para se governarem em vez de governarem, e a confissão de que nem sequer vale a pena participar nos actos eleitorais, porque quem manda são os que vão para o “tacho”.

Regra geral, julgo que se mantêm válidas as constatações de André Freire no estudo “Desempenho da democracia e reformas políticas - o caso português em perspectiva comparada”, que constata, entre outros aspectos, «uma forte adesão dos cidadãos aos princípios básicos da democracia, mas também um forte criticismo face à classe política, uma insatisfação crescente com o desempenho da democracia e um elevado afastamento face ao poder».

Ora, a participação mais activa dos cidadãos na vida pública pode ser o elemento decisivo para que governantes e governados não andem de costas voltadas. Só que uma democracia participativa exige, a priori, uma condição essencial: a vontade de participar.

Aquilo a que estamos a assistir é um contexto que não favorece a cultura de participação. Se pensarmos no percurso típico de uma pessoa dos nossos dias, vemos que ele começa, na maioria dos casos, com uma infância atolada em actividades e preocupações sobre se a consola dada pelos pais ausentes é melhor ou não do que a do vizinho. Segue-se a escola, em que as associações de estudantes são redutos de alguns, tantas vezes aprendizes de caciques, feitas de eleições em que não se aposta na elaboração de programas, que também ninguém parece interessado em ler. Chegada a vida adulta, há que lutar por um emprego, para pagar o empréstimo da casa, dos carros, das férias e outras prioridades. Fica, definitivamente, muito pouco tempo e energia para pensar no bem comum.

Para além disso, para participar é necessário – ou assim deveria ser – estar informado. E vemos que somos um país que lê muito pouco e que recebe a informação pela televisão e pelos jornais gratuitos, o que, convenhamos, é insuficiente para quem quer ficar realmente esclarecido sobre o que se passa à sua volta.

A participação surge, muitas vezes, apenas como reacção a problemas pessoais. Só que fazemos isso da pior maneira: optamos por figuras tristes em frente às câmaras de televisão. Os meios de comunicação social, que têm o poder de definir a agenda, o agenda setting (não dizem às pessoas o que pensar, mas conseguem determinar sobre o que é que elas vão pensar), ainda continuam dependentes das fontes oficiais, fruto de um jornalismo de fundilhos na cadeira, mais lucrativo economicamente, de pseudo-eventos, nas palavras de Daniel Boorstin, e de pequenos/grandes escândalos, em muitos casos, de faca e alguidar.

Há anos que a União Europeia tenta incentivar a formação de lóbis, como forma de combater o afastamento das populações dos políticos e de alargar os contributos da sociedade para a governação dos países. Mas por cá parece que recebemos a informação por snail-mail e só recentemente a questão chegou ao Parlamento português. Os grupos de interesse ainda são vistos simplesmente como grupos de interesseiros.

Se o desafio é grande para os cidadãos, não é certamente menor para os políticos e para as estruturas políticas. A classe política vai ter de se habituar a fazer uma verdadeira audição do que as pessoas têm para lhe dizer, em vez de fingir ouvir só porque isso favorece a sua cada vez pior imagem. O que se assiste em várias circunstâncias, seja a nível nacional ou local, é à simulação da auscultação da população para que todos fiquem contentes, mas sem que esse processo tenha consequências práticas.

Mesmo os partidos políticos parecem viver num universo à parte. A meritocracia deu lugar ao carreirismo. Ouvem apenas os “seus”, premeiam os mais bem comportados em inenarráveis processos de escolhas de candidatos e fazem programas que não tencionam cumprir. Tudo muito democrático, portanto.

Neste cenário há, agora, mais factor a ter em conta: as novas tecnologias. Concordo com João Pissarra Esteves, quando ele diz que «não será certamente a Internet que pode resolver todos os problemas da democracia [...] A hipótese formulada limita-se a reconhecer que este novo medium reúne condições que possibilitam um certo aperfeiçoamento da democracia».

É inegável que a Internet facilita a participação. Muito do que antigamente parecia inalcançável está apenas à distância de um clique. Mas muito está, certamente, demasiado longe. Não nos podemos esquecer que ainda nem todos têm ligação à Internet, nem sequer computador, apesar das campanhas que se vêem por aí e que dão a ideia de que vivemos no paraíso das novas tecnologias. E que mesmo entre os que têm computadores topo de gama e Internet de banda larga, incluindo pessoas com formação superior, a literacia deixa a desejar.

Estaremos nós preparados para dar um salto qualitativo e passarmos de meros votantes ocasionais a cidadãos de pleno direito? Condições para isso começa a haver, se é que não houve já nos últimos 30 anos. Vontade já se nota em alguns sectores da sociedade, quer seja por parte de cidadãos, quer seja das instituições. Agora compete a cada um engrossar esse movimento e fazer a diferença.

(*) Coordenadora Geral do Diário do Minho e doutoranda em Ciências da Comunicação

Democracia Participativa, por António Amaro das Neves*

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Democracy is the worst form of government, except for all those other forms that have been tried from time to time.
[Winston Churchill, 1947]

Que me perdoe quem me convidou para escrever sobre este assunto, mas começo por confessar que não sou o maior dos admiradores da democracia participativa.

Estou em crer que a democracia não necessita de ser adjectivada. Expressões como democracia representativa ou democracia participativa são redundâncias desnecessárias. Por outro lado, confesso que mantenho as minhas embirrações com certas palavras e que participativo/a se encontra entre elas. É um neologismo com o qual não simpatizo e que, por isso, nunca utilizo.

Estou convencido de que Portugal não tem um problema com o seu modelo de democracia (é um sistema imperfeito, concedo, mas nunca tivemos outro melhor). A nossa lei fundamental assegura, de modo que me parece claro e suficiente, a defesa dos direitos, das liberdades e das garantias de participação política dos cidadãos. Portanto, acredito que não é do lado da democracia que se pode colocar o problema da participação, mas sim do lado da cidadania: o que o país necessita é de cidadãos participantes.

Podemos avaliar o modo como vamos utilizando os direitos de participação que são nossos por imperativo constitucional. Lamentavelmente, a maioria dos exemplos que sou capaz de citar não são muito estimulantes. Não somos muito dados a utilizar o direito de petição ou de acção popular, em parte por não estarmos convencidos da sua eficácia. Com frequência nos queixámos de que não nos revemos no actual espectro partidário. Nada nos impede de criarmos novos partidos, mas os exemplos que temos tido não são muito animadores. Basta recordar o que se passou com o PRD, criado por pessoas que se reviam no exemplo político do Presidente Ramalho Eanes, que não era enquadrável nas organizações partidárias então existentes. Os resultados desta experiência começaram por se revelar um espantoso caso de sucesso na participação de grupos de cidadãos na vida política do país. Depois, foi o que se viu: o PRD desintegrou-se e acabou transformado num grupelho fascizante e xenófobo, o PNR, facto que deve causar alguns arrepios na espinha dos democratas que embarcaram na esperança eanista.

É ao nível local que as questões da participação activa dos cidadãos pode ter maior relevância. Aos cidadãos que têm ideias diferentes das que são assumidas nos programas dos partidos para o desenvolvimento das suas terras é assegurado o direito de apresentarem candidaturas aos órgãos autárquicos. Também aí os exemplos das experiências passadas não são muito encorajadores. Basta ver o que se passou nas últimas eleições: quando alguns partidos quiseram ver-se livres da pior tralha que havia neles, logo apareceram grupos de cidadãos a proporem candidaturas independentes e lá ficaram os Valentins, os Isaltinos e as Fátimas Felgueiras. Eis a democracia participativa no seu pior.

Por outro lado, vejo com desconfiança as novas formas de participação e de influência nas decisões dos políticos, que se movem por pulsões mediáticas, que vão ganhando balanço nos dias de hoje e que funcionam, mais ou menos, assim: no noticiário da hora de almoço alguém apresenta um caso lamentável, resultante de uma decisão de uma qualquer junta médica ou algo que o valha, provavelmente uma situação que se arrasta há muito tempo, sem solução à vista, pelos infinitos corredores do Estado, e logo se apressa um ministro qualquer a resolver o problema até aí insolúvel, ainda a tempo do noticiário da hora de jantar. Não vejo grande futuro para a democracia de um país que se deixa governar assim.

Por último, e porque, ao que percebo, o que se pretende é dar continuidade ao debate que neste espaço foi lançado sobre a democracia participativa, deixo duas notas, tiradas a talho de foice:

1. Parece-me muito discutível a afirmação aqui deixada por Manuel Monteiro de que “na Grécia antiga a existência da democracia era pressuposto de uma participação efectiva dos cidadãos, participação essa tributária do princípio do DEVER de todos darem o seu contributo para o governo da Cidade”. A participação de todos? Os tais todos de quem se fala, os atenienses com direitos de cidadania e de participação política, correspondiam apenas a cerca de 10% da população da cidade. Como todos sabemos, eram excluídos daquela democracia os metecos, os escravos e as mulheres. Como é óbvio, tais exclusões não se podem enquadrar no nosso critério de democracia, que, além do mais, jamais classificaria de democrática uma sociedade que praticasse o esclavagismo. Pois é: os gregos inventaram a palavra democracia, mas não a democracia tal como nós a entendemos.

2. Não sou o único democrata que desconfia das infinitas virtudes da democracia participativa, longe disso. O próprio autor deste blogue também tem as suas reservas. Tenho para mim que o instituto do referendo será, pelo menos no plano teórico e afora as eleições, o mais democrático instrumento de participação dos cidadãos na tomada de decisões que afectam o país, pelo que acredito que, quem defende, sem reservas, a democracia participativa, não pode senão defender o referendo ao Tratado de Lisboa. A afirmação de Pedro Morgado de que o Tratado não deve ser referendado “porque não parece que as populações saibam muito bem o que está em causa”, devendo por isso ser aprovado pelos deputados, que “são pagos exactamente para tomar decisões”, afigura-se-me demonstração eloquente do que fica dito.

(*) Presidente da Sociedade Martins Sarmento. Autor do blog Memórias de Araduca.

Democracia Participativa, por Bruno Gonçalves*

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A possibilidade de um cidadão comum poder participar activamente no processo de decisão governativa nem sempre foi uma ideia popular entre a classe política. Nos últimos tempos, em várias disputas eleitorais, notou-se que esta ideia tinha tomado novos contornos, isto é, não só existe o desejo de que as pessoas tenham um maior peso no processo de decisão das políticas que regem um país, como já se pretende que haja um processo participativo, de uma forma directa, por parte dos cidadãos.

Esta democracia participativa, que várias personalidades tanto gostam de evocar como a forma ideal de fugirmos aos problemas que a maioria dos regimes apresentam, trata-se meramente de uma ideia utópica, incapaz de ser levada à prática, seja pela cultura ou pela própria organização da maioria das sociedades. Mesmo num cenário hipotético em que este sistema fosse implementado, as suas consequências seriam letais para a sociedade.

O advento das novas formas de tecnologia fez sonhar muitos apologistas da participação directa dos cidadãos. Deparando-se com um sistema pouco eficaz, corrupto e quase sempre refém de guerrilhas partidárias no interior do hemiciclo, é possível que a ideia de fazer uma votação on-line sobre uma determinada matéria, e recolher a respectiva decisão dos cidadãos no dia a seguir, seja sugestiva, para não dizer, aliciante.

Este sistema, por mais apelativo que seja, é insustentável e rapidamente conduziria a um país estagnado nas suas políticas. Os governantes e políticos seriam reduzidos a secretários que conduziriam um país com base em gráficos, impondo sucessivas medidas contraditórias, incoerentes e impraticáveis na maior parte das vezes. Pode-se argumentar que a maioria das sociedades não está preparada para um sistema semelhante, daí que a solução seria referendar matérias ocasionalmente. É verdade que tal seria um sistema mais moderado, mas nunca existiria uma barreira clara e precisa entre as matérias e o método de decisão, algo essencial para a estabilidade e o sucesso de um modelo.

Um sistema de democracia eficaz jamais pode passar por um sistema de democracia participativa directa. Seria um notável erro político e um desastre na sociedade. A cultura de responsabilidade, transparência e progresso, tem de assentar numa cultura de representação. As eleições, os seus programas, têm que assentar numa pessoa, num grupo político, capaz de ser responsabilizado pela condução das ideias que o fizeram ser eleito. Um sistema assente no princípio da subsidariedade em democracia representativa, é o único sistema capaz de fazer face aos desafios que actualmente se proporcionam.

Segoléne Royal durante a campanha para as presidenciais francesas referiu por diversas vezes que era altura de dar voz aos cidadãos, de serem estes finalmente os responsáveis pela governação. Estas declarações quase naïves da candidata, mostram a característica mais perigosa deste tipo de democracia directa - a diluição da responsabilidade dos sucessos e fracassos de um programa, atribuídos a um conjunto de estatísticas, correspondente à sociedade.

Madame Royal não compreende o perigo desta abordagem, preferindo continuar com o seu sound-byte da démocracie participative. Esquece que o melhor sistema político continua a ser a eleição e julgamento dos representantes pelos cidadãos. E felizmente para a França, as suas ideias foram rejeitadas pelos eleitores franceses.

* Estudante de Medicina (FML). Foi colaborador da Dia D e escreve na Atlântico.

Democracia Participativa, por Paulo Duarte, SJ*

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Governo do povo! É o significado etimológico de democracia. À partida já inclui o atributo, porque se corresponde ao governo do povo, este deve ser participante das decisões a tomar. Será possível? O povo não é uma entidade isolada, é um conjunto de indivíduos, cada qual com a sua história pessoal intra e inter relacional. Cada pessoa forma a sua opinião sobre o que a rodeia, podendo concordar, discordar, ou lhe ser completamente indiferente o assunto a tratar. Por existir a possibilidade da indiferença, para mim, o atributo “participativa” ganha uma razão de ser especial. Afinal, se há um desligar da realidade social, esquecendo a importância do valor do voto, do comentário, da opinião, isso pode provocar o assumir do poder já não democrático, mas com seguimento para o autoritarismo.

No entanto, para haver uma participação tem de se saber o que se passa e pensar sobre isso mesmo. Será que sabemos pensar com objectividade? Será que são postos os dados na mesa para que o povo também possa governar evitando que se descarte, de alguma forma, dessa função? De facto, é possível saber muitas coisas, no entanto esta sabedoria pode-se limitar à superficialidade do conhecimento, em que a pessoa fica-se pelo mero saber de algo. Ora, é no aprofundar deste saber adquirido que se dá o desenvolvimento humano, sendo este, no fundo, uma auto-compreensão que leva à seriedade da vida, num diálogo constante entre o ser humano e a sociedade, havendo, assim, uma maior possibilidade participativa no sentido da construção social. Uma formação adequada, ao nível humano, académico, intelectual, permite que a opinião passe da decisão pela simples emotividade, para uma decisão que seja ponderada num olhar cada vez mais vasto, quer para o indivíduo que toma a decisão, quer para a comunidade/sociedade na qual participa.

Mas, tendo em conta que a nossa democracia é representativa, como é que se pode concretizar, além do voto, a “participação” do indivíduo formado? A meu ver, saindo da indiferença a que se pode instalar e, através os meios que dispõe (blogs, livros de reclamações, direitos de antena), usar da sua palavra resultante do seu pensar, relembrando aos responsáveis eleitos que não são detentores do poder, mas responsáveis pela sociedade que os elegeu.

(*) Companhia de Jesus

Democracia Participativa, por Francisco Sousa*

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Não pretendo escrever um manifesto contra os auto-intitulados «históricos» da blogosfera portuguesa, mas desmistificar a sua ideologia metabolicamente reduzida, que, em termos políticos, é uma «velha senhora» já nossa conhecida. Seguiremos três vias selvagens que não serão elaboradas exaustivamente e com o rigor filosófico que merecem:

1) Os auto-intitulados históricos não fazem ideia do que significa «história». Os verdadeiros fazedores de história digital criaram as novas tecnologias da comunicação que todos usamos e disponibilizaram os instrumentos e serviços necessários que nos possibilitam ter acesso a determinados serviços e sem custos significativos. Apesar do carácter empresarial destas iniciativas americanas, a verdade é que elas abriram-se a todos, à escala do mundo global, e podem ser usadas para a defesa da democracia contra as forças obscurantistas das trevas e do mal. A Internet é efectivamente um meio democrático, porque, ao contrário doutros meios de comunicação social (TV, rádio, jornais), possibilita uma diálogo, pondo termo ao modelo unidireccional de comunicação. Ora, os «históricos» são meros utentes desses serviços disponibilizados pelas grandes empresas da comunicação, mas são utentes que desejam colonizar artificialmente esses serviços, de modo a impor uma comunicação processual que rouba o acesso à palavra por parte dos outros utentes reduzidos a «leitores». Encaram os seus blogues como «feudos» e, como não conseguem acompanhar o sentido das inovações tecnológicas, criam «confederações» de bloguistas, cujo objectivo é colonizar a chamada «web social» e tentar bloquear a visibilidade dos outros bloguistas portugueses, que usam estas funcionalidades para outros objectivos mais nobres e libertos da preservação de uma vida metabolicamente reduzida.
Se na América se fala na «tirania da maioria» (Alexis de Tocqueville), em Portugal podemos falar na «tirania da minoria»: meia dúzia de pessoas tenta desesperadamente silenciar a voz dos cidadãos portugueses, como se fossem os seus porta-vozes definitivos. Ora, a Internet abre as portas a todos e deita abaixo todos os muros. Pela primeira vez na história, todos os mortais têm acesso à palavra e podem participar na esfera pública, sem mediações corrompidas que nunca representaram as verdadeiras aspirações dos portugueses. Contra esse colonialismo blogosférico, lutaremos até vencer. Queremos democracia real e não uma esfera pública online refeudalizada e colonialista!


2) Tal como fazem os funcionários públicos ameaçados pelas reformas excelentes iniciadas por este governo, os «históricos» defendem um suposto «direito adquirido», que só existe nas suas cabeças. Eles não fazem história, até porque não têm conhecimentos suficientes para captar o sentido das novas tecnologias ou o sentido da sua história: bloqueiam ou tentam bloquear a história democrática e matar a inocência do devir! «Direitos adquiridos» na blogosfera constituem um atentado contra a democracia online e a sua defesa corporativista é simplesmente blogofascismo. Mas o sentido desta «acção» é previamente conhecido: os «históricos» não querem partilhar aquilo que não lhes pertence. A blogosfera não lhes pertence e, portanto, não têm «direitos adquiridos». E, se alguma lei protegesse esses supostos direitos, teríamos de lutar contra ela, tal como os revolucionários da Revolução Francesa ou da Revolução Americana lutaram pela libertação. Aquilo que eles temem é a concorrência e a própria democracia. Com efeito, para eles, «democracia» significa confiscar a palavra dos outros: «Eu escrevo, tu lês...». Todas as tiranias são insuportáveis, mas a tirania da mediocridade é a mais terrível de todas.

3) Os «históricos» pretendem subverter o sentido das palavras e usam certos termos num sentido metabolicamente reduzido. Um desses termos é o de info-exclusão ou mesmo o de info-analfabetismo. Afirmam que a maioria dos utilizadores da Internet usa o computador como «máquina de escrever» e acusam certos bloguistas de não cuidarem da «imagem» dos seus blogues. Eles pretendem ser info-informados, os outros são info-analfabetos. O que eles não percebem é que os pejorativamente chamados «leitores» interessam-se mais pelo conteúdo e pela sua qualidade do que pelas «embalagens», repletas de publicidade e citações desvirtuadas, dos blogues. A info-exclusão é um conceito sociológico e, portanto, político, que se combate nas escolas e com o acesso de todos às novas tecnologias da informação e comunicação.
É evidente que esta crítica não se dirige a todos os bloguistas portugueses, cujos nomes merecem figurar na história da blogosfera portuguesa, mas somente àqueles que pretendem monopolizar, refeudalizar ou colonizar a blogosfera, chamando-lhe Web Social, de resto pensada à dimensão do cérebro de LILLI.


Prevejo que a sociedade do futuro irá dispensar o jornalismo medíocre e a chamada «opinião pública» e, se isso suceder, representará mais uma vitória da Democracia participativa.

(*) Doutorando em Ciências da Saúde. Autor do Blog CyberCultura e Democracia Online.

Será Vírus ou Milagre?

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Mesquita Machado diz que recebeu sugestões de 5.000 cidadãos através da internet para o Plano de Actividades e Orçamento. A participação foi absolutamente fantástica e o número avançado é tão soberbo e superlativo que nem dá para acreditar.

Em 5 meses (de Agosto a Dezembro de 2006), o Provedor do Telespectador da RTP recebeu 9120 e-mails, o que traduz uma média de 1824 mensagens por mês. O Orçamento Participativo, que decorreu durante o mês de Setembro, conseguiu recolher, na versão oficial, a opinião de 5.000 cidadãos, o que multiplica por 2,74 o número de mensagens enviadas para o provedor da RTP durante um mês. Se tivermos em conta que mais de 10.000.000 de pessoas são potenciais espectadores da RTP e que a estação divulga regularmente o serviços e que o Município de Braga tinha no último recesseamento 164.192 habitantes não tendo sido feita qualquer divulgação especial do Orçamento Participativo, depressa chegamos à conclusão de que estamos perante um autêntico fenómeno que merece ser estudado e investigado a fundo.

Afinal como se justifica esta epidemia participativa que terá assolado os domínios bracarenses? Será que os jornalistas presentes na conferência de imprensa se lembraram de perguntar? Não sei. Mas confesso que estou interessado em conhecer a fórmula do anunciado sucesso.

Democracia Participativa, por João Delgado*

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Por esta altura do debate é de supor que os visitantes deste blog já estão inteiramente elucidados sobre os contornos legais que as diferentes modalidades de democracia têm no nosso país, desde logo a partir da Constituição da República". Partindo deste pressuposto, aproveitaria este espaço para tecer algumas considerações acerca da participação na vida pública dos cidadãos, porque é neste aspecto que julgo residirem algumas das maiores fragilidades da nossa democracia, "lato sensu".

Refiro, especificamente, as organizações de cidadãos, em esferas tão diversas como o mundo do trabalho, a cultura, o cooperativismo, a defesa do ambiente, direitos dos consumidores, direitos de parcelas específicas da população (mulheres, menores, sexualidades alternativas, imigrantes, comunidades étnicas), enfim, poderia continuar esta enumeração sem abarcar todas as possibilidades e necessidades que uma democracia viva exige dos seus "utentes".

Os teóricos e académicos têm maioritariamente apontado o longo período sob a ditadura de Salazar e Caetano como um dos principais entraves à participação dos portugueses na causa pública mas, 33 anos volvidos sobre o 25 de Abril, é necessário que essa reflexão seja menos simplista e procure entender porque regrediram as iniciativas organizativas que, com alguma pujança, surgiram nos anos imediatamente posteriores à Revolução.

E, sobre estes anos mais recentes, é notório que numa primeira fase aconteceu um imenso desencanto relativo aos resultados práticos da implementação da democracia na vivência comum. Se é inquestionável que as condições de vida dos portugueses foram radicalmente alteradas, que o estado "civilizacional" da nossa sociedade sofreu profundas transformações, também é verdade que as relações de poder pouco se alteraram e que, depois de uma emergência durante o PREC (Processo Revolucionário Em Curso), rapidamente voltaram os patrões, os presidentes de câmara, os chefes, os "doutores", em suma, os mesmos protagonistas do regime fascista regressaram ao domínio da vida colectiva, se bem que agora (quase sempre) legitimados pelas leis da democracia.

Será, então, urgente um novo grito de liberdade, para que possa ressurgir em Portugal essa participação generosa e solidária, quantas vezes anárquica e inconsequente, mas absolutamente fundamental, para que a democracia não se consolide como um conjunto de normas e práticas rotineiras, a que apenas somos chamados para ratificação de quatro em quatro anos, sem que, as mais das vezes, exista a percepção de que os protagonistas posicionados para a conquista do poder apresentam de facto projectos alternativos para a gestão da coisa pública.

(*) Membro da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda

Democracia Participativa, por Manuel Monteiro*

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Na Grécia antiga a existência da democracia era pressuposto de uma participação efectiva dos cidadãos, participação essa tributária do principio do DEVER de todos darem o seu contributo para o governo da Cidade. Hoje, e dum modo quase generalizado, a democracia é vista como um direito e um direito que os cidadãos usam e evocam, quando isso lhes é mais conveniente e vantajoso. Neste caso a democracia representativa tornou-se um instrumento cómodo, já que após a eleição do gestor, do gestor político, muitos dos "accionistas", por certo a maioria, dedicam-se ao desporto mais emblemático dos regimes democráticos e que consiste na crítica, pela crítica, na oposição verbal a tudo quanto cheire a política e a políticos, ainda que tais bravatas não tenham qualquer consequência no acto eleitoral subsequente.

Esta nota introdutória permite dar a conhecer o meu pensamento sobre a chamada democracia participativa e sobre a importância da participação na vida da comunidade. Ao contrário da tese que esgota essa participação como um direito e que parte daqui para a exigência costumeira face aos mais variados poderes públicos, eu entendo a participação também como um dever e considero que não há democracia plena, sem que todos os seus beneficíários contribuam para a sua manutenção e constante revitalização. Se queremos democracia temos de a alimentar e alimentar a democracia não significa apenas votar de tempos a tempos. Se, ao contrário, tanto nos faz viver num regime democrático, como num regime ditatorial então nada melhor e mais exemplar do que fazer o que, salvo honrosas excepções, temos vindo a praticar até aqui. Participar não é pois, somente, um direito; participar é, cada vez mais, um dever, uma exigência cívica. É verdade que não podemos ser alheios a fenónemos de mobilização, logo de participação, que se registam em variadas circunstâncias. Esses fenómenos, que classifico de intervenções verticais, são o resultado da preocupação das pessoas face a qusetões muito concretas, que as afligem ou impedem de prosseguir com normalidade o seu caminho. Os cidadãos hoje (e os partidos, tal como os sindicatos, ainda não perceberam bem isto), estão mais preocupados com a sua pequena comunidade (a passadeira de peões; o estacionamento; os espaços verdes no seu bairro; a segurança na rua e nos transportes que frequentam; o emprego; o funcionamento do seu centro de saúde), do que com a grande política. Verdade seja dita que esta também não existe, nem se vislumbra, desde logo porque os líderes foram substituídos por pequenos chefes e os estadistas deram lugar a vorazes conquistadores de votos. Como conciliar então estas duas realidades? A distância maior das pessoas face aos problemas do Estado, com a dedicação mais premente face aos dramas do seu núcleo familiar, empresarial, habitacional? Desde logo através da participação cívica, sentindo - a como algo de natural numa Cidade de pessoas que mais facilmente alcançam a satisfação comum, quanto maior for a satisfação individual dos interesses de quem a compõe.

Esta participação é ainda, no meu modo de ver, mais necessária, perante a crescente globalização e os efeitos que dela decorrem nas tradicionais estruturas da sociedade. Para quem como eu não confunde a defesa do individuo, com o individualismo egoísta, tão pouco com o isolamento doentio e preverso para que muitos cidadãos são empurrados; para quem como eu acredita na democracia apesar dos seus ilimitados defeitos; para quem como eu defende a Liberdade e a Justiça, o debate sobre a sustentação de uma Democracia Participativa, na lógica do direito e também do dever, é um debate do presente e do futuro.

(*) Fundador do Partido da Nova Democracia

Democracia Participativa, por Rui Rocha*

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A aplicação prática da totalidade do que o conceito de democracia abarca dificilmente será atingida. Ainda assim, o caminho nesse sentido só poderá dar-se através da intromissão dos cidadãos nas decisões públicas. Essa intromissão só pode ter consequências positivas para a comunidade mas tem necessariamente de ser antecedida de uma completa abertura política a ela. Em Braga assistimos a um abrir de portas à participação dos cidadãos, pelo que a vivência comum só pode sair engrandecida. Resta saber até que ponto a receptividade autárquica é factual (ou se se trata de um mero joguete político).

Ao mesmo tempo em que aumentam o poder decisório dos cidadãos, os executivos (centrais, regionais ou locais) abdicam da possibilidade de centralizar as medidas políticas em si mesmos. É então que cresce a participatividade. Numa sociedade ideal as formas de contribuição política do cidadão comum e o seu nível intelectual aumentam cada vez mais, ao passo que paralelamente os líderes políticos e respectivas equipas vão perdendo o poder de decidir com base nas suas próprias concepções sobre o que é melhor e pior para aqueles que governam.

(*) Director do Jornal ComUM

1.000 Posts numa Avenida Plural

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A Avenida Central é o centro cívico de Braga, o passeio público de uma cidade que já foi dos arcebispos, a praça do cosmopolitanismo bracarense e a placa giratória do Minho português.

Nela confluem gentes vindas de Vila Verde, de Amares, de Ponte de Lima, de Guimarães, de Famalicão, de Barcelos, do Lanhoso, de Varzim, de Cabeceiras, de Vieira, de Bouro, de Trás-os-Montes, das Beiras, da Estremadura, da Espanha, da Ucrânia, da Bulgária, da Roménia, de Angola, de Cabo Verde, de São Tomé, de Moçambique, da Holanda, da Bélgica, da Inglaterra, da Polónia, da Alemanha, da Polónia ou do Brasil. Nela confluem ideias da democracia ao nacionalismo, do estalinismo ao fascismo, do socialismo à social democracia, da democracia cristã à ortodoxia católica, do ateísmo ao totalitarismo ou do monarquismo ao republicanismo. Nela se erguem sonhos. Nela desaguam lágrimas. Nela se constrói a mudança.

A Avenida Central é o chão que José Sócrates, Durão Barroso, António Guterres e Cavaco Silva calcorrearam antes de serem eleitos. A Avenida Central é a praça que inspirou Camilo Castelo Branco, são as paredes que fizeram ressoar as músicas dos Mão Morta e são as pedras que sustiveram vivas a Abril.

Esta Avenida Central, mais pequena, mais humilde e mais modesta, chega ao post 1.000 e celebra o primeiro ano de actividade no próximo dia 7 de Novembro. Para lembrar estes marcos, convidámos várias personalidades a escreverem um contributo para o debate em torno da Democracia Participativa. Os textos que fui recebendo e outros que ainda me estão prometidos serão publicados ao ritmo de um a cada dois dias. A todos os que aceitaram dar o seu contributo, o meu sincero reconhecimento.

Eléctrico: Universidade do Minho Desconhece Estudo

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Em 11 de Outubro, Mesquita Machado anunciou publicamente a realização de «um estudo de mobilidade urbana, que está a ser elaborado pelos Transportes Urbanos de Braga (TUB), em colaboração com o Departamento de Sociologia da Universidade do Minho». Seis dias mais tarde, dei conta das várias perplexidades que o referido anúncio me suscitou, entre as quais referia a estranheza pelo factos de os nomes dos investigadores nunca terem sido divulgados.

Hoje ficámos a saber, através de uma investigação do Jornal Online ComUM, que afinal «o Departamento de Sociologia da UM afirmou “não ter conhecimento” de qualquer estudo neste sentido». O Presidente dos TUB, por sua vez, anuncia que «o inquérito está praticamente fechado».

Sem comentários.

Democracia Participativa (III)

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«É preciso outro tipo de intervenção na política, é preciso, afinal de contas, aquilo que discutimos hoje: aumentar a democracia participativa. As leis já todas elas falam de democracia participativa. Desde a acção popular, até as várias leis sobre o território, todas falam. Mas é necessário criar esta cultura de participação e não ter medo das pessoas em carne e osso, ou seja, dos cidadãos que se preocupam com as causas da República.» [Gomes Canotilho.12/03/2006]
"Mi vida en tus manos", um filme de Nuno Beato

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