
A necessidade de uns dias de pleno descanso levou-me até ao Nordeste Transmontano, as terras que guardam as minhas raízes e parte do meu coração. Esta é a crónica de uma viagem por terras únicas cravejadas de gente acolheadora, num Portugal que está abandonado. O abandono sente-se na mágoa das gentes e no silêncio dos espaços. Lugares que já foram torrentes de vida humana, são hoje sustento para ervas daninhas. Lugares onde a única sinfonia humana é a das paredes que se desmoronam por falta de manutenção.

O Nordeste precisa, urgentemente, de um plano de salvação. E a salvação só consegue por duas vias: por um lado, com o emparcelamento das pequenas propriedades, criando
áreas de cultura de produtos de qualidade superior, seja vinho, seja azeite, seja castanha ou batata e, por outro lado, com a criação de
áreas de turismo, capazes de atrair ainda mais turistas e competir com outros centros nacionais e internacionais. Fazer de todo o Nordeste um museu humano para ver, de onde em onde, os poucos que por lá vão subsistindo está a levar uma desertificação e a uma decadência atrozes, cujas consequências serão, a curto prazo, ainda mais dolorosas.

Não se percebe
o abandono da 'cidade perfeita' erigida no Barrocal do Douro, em Picote, quando foi construída a barragem. Tanto as casas dos engenheiros como a pousada poderiam constituir-se como um importante pólo de turismo de qualidade para toda a região das Arribas do Douro. Este complexo está, felizmente, em vias de ser
classificado pelo IPPAR.
Não se percebe o
abandono da maioria das estações da antiga linha que ligava o Pocinho a Duas Igrejas, nem a incapacidade para construir uma ciclovia no seu trajecto. Como também não percebe o
abandono de tantos e tantos edifícios das antigas escolas primárias dispersas pelas aldeias e lugares de todo o Nordeste. Com poucos recursos seria possível criar centros dedicados ao apoio à terceira idade em alguns destes locais e, noutros, núcleos de divulgação turística.
Não se percebe o
abandono da Lama Grande, um dos pontos mais altos da Serra de Montesinho. Neste caso, a casa do Parque Natural, que já fora em tempos alugada para turismo de montanha, está tristemente vandalizada, tendo inclusivamente sido retirados 3 dos 4 painéis de energia solar que lhe serviam de sustento energético.

Apesar de tudo, Bragança e Miranda conseguiram fazer o seu passado histórico e monumental conviver lado a lado com o futuro. São cidades bem dimensionadas, bonitas e acolhedoras. Sendim, que chamou a si o epíteto de Capital das Arribas, consegue potenciar-se turisticamente por via das iniciativas culturais que promove: uma aposta igualmente ganha. Casos de sucesso, mas muito pouco para uma região que ocupa um vasto território e alberga muitas das histórias que compõe a História do país.
É tempo de recuperarmos o Portugal que continua abandonado e que, antes de descobrirmos Tailândias e Méxicos, saibamos (re)descobrir o nosso país.