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[Avenida do Mal] O Meu Carro, Outra Vez...

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Os leitores de coisa séria que me perdoem mas esta semana contei o enésimo assalto à minha viatura. Descrevo-o aqui, ao carro primeiro, porque é um clássico japonês, daqueles de uma marca que abunda por Braga, tanto que fico sossegado para o dia em que me decidir por restaurá-lo e precisar de peças. Mas até lá vai-se descascando de lado. A tinta azul escura tem vários padrões de tom e estala com a mudança de cara do tempo – hoje: chuva e granizo e o distrito em alerta amarelo. Não faço por lavá-lo por cima. A chuva que o faça, e dada a poluição, acredito talvez com detergente, ácido ou lá o que for. Prova disso são umas 3 ou 4 manchas no capot, esbranquiçadas, como sabão seco, de mar morto e renascido de sabão. Isso e uma pegada de sapatilha sobre mala, uma única pegada - parece que alguém escorregou o pé desde as nuvens e segurou o tropeção sobre o meu carro, ou então algum desses desportistas radicais urbanos, que vindo a correr de trás, saltou e ali apoiou um mortal em frente por cima, fazendo pose de costas para o pára-choques. Palmas para a Komaneci!

Mas vamos ao assalto, tão vulnerável que está a viatura ao meu desleixe, também o está na fechadura a quem resolver rodar um pau na ranhura. Não é feito de MacGyver mas deve fazer, por momentos, qualquer larápio corar de orgulho. O pior é o recheio. Quem me conhecer – não que me compre – sabe que por lá jazem dois punhados de cassetes, originais e gravadas, e todas comidas na fita magnética pelo rádio e leitor de cassetes – um dos botões, o de FF ou RW, conforme, porque o mesmo leitor lê os dois lados com a cassete na mesma posição, saltou e sobrou-lhe um apêndice interior metálico que me pica o dedo sempre que me decido por fazer comer mais uma fita –, tem também uns tapetes mal dobrados cobertos de areias e migalhas, e quem, na sua carjacker figura, se decidir por fazer ligação directa olha uma manivela de mudanças que quase que não se lhes descortina as velocidades. Mas da caixa vai o mal menor: embraiagem está esticada e bem baixa, solta e leve, que o mecânico deu-lhe um jeito de se aguentar uns dias e mesmo assim a marcha-a-trás está difícil e faz aquele som mastigante sempre que insisto carregando com o pé esquerdo bem ao fundo. Também não sou homem de pressas, mas os pneus da frente têm as jantes escuras, os discos de travão fazem uma fumarada tremenda e não consigo explicar porquê, estão pretas. Ah sim, o assalto. Era o enésimo, dizia. Mais uma vez sobrou uma desarrumação, papéis e o livrete – ao menos isso, os recibos da AENOR. Sim, às vezes pergunto-me como um carro destes pode andar em autoestradas e elas tão caras. Anda, mas há-de vir o dia da silhueta do meu carro se juntar ao tractor e à carroça, à bicicleta, à vaca e ao peão.

Adiante: nada. Não roubaram nada. Só fiz por transferir a desarrumação sobre o banco do pendura de volta ao guarda-luvas, este que tanto custa a fechar – está lixado na mola. Arrumei e meti a chave e o motor a funcionar. Acordou, como sempre, estremunhado e a berrar - puxa o ar por ele, já era à frente em 88... Mas, é verdade, nem gasolina me roubaram, porque tenho a ranhura fechada à chave moderna. É que, com a escalada diária dos preços..., quem sabe não a guardava em depósito de banco e a punha a render.

Com isto, quase que exigia – pela desarrumação, pelo caos metido no meu pequeno reino de caos – videovigilância! Daquela que resolve os males todos da insegurança, de Londres ao Bairro Alto, e que dá emprego a videovigilantes. Aliás, arte em ascensão, na polícia e bombeiros, gorilas de diversão nocturna, e alternativa em salário. Os alfaiates como os homens livres, parece-me, estão em vias de extinção.

2 comentários:

  1. Carro japonês por muita violação que sofra, roda a chave e trabalha, além de estar sempre à frente no tempo ;)

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  2. Braga está a ficar um gueto, um antro..esse lobby da construção em que os trolhas fizeram fortunas através de construção ás toneladas e barata só atraiu para Braga gente que não interessa. Os verdadeiros bracarenses, os que fizeram de Braga uma cidade "gira" noas anos 70 e 80 já há muito que estão a deixar a cidade.
    Está um lugar deprimente esta cidade

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"Mi vida en tus manos", um filme de Nuno Beato

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