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Dos Limites da Objecção Religiosa

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«Na segunda-feira, durante uma conferência internacional, o papa afirmou que os farmacêuticos deveriam ter o direito de exercer uma objecção de consciência no caso de o medicamento a ser vendido interromper a gravidez, provocar aborto ou contribuir para a eutanásia.» [Reuters]

A questão não é nova. Já aqui trouxe a história de alguns estudantes de medicina radicais muçulmanos que se recusam a ver pacientes do sexo oposto e a estudar doenças transmitidas sexualmente ou decorrentes da ingestão excessiva de bebidas alcoólicas. Quando sugere aos farmacêuticos adoptarem posições religiosamente intolerantes, o Papa embarca na mesma intolerância dos radicais muçulmanos. Como lembra Ricardo Alves, se a vontade do Papa fosse admissível, então um médico também poderia recusar-se a fazer transfusões de sangue por imperativo de consciência.

A liberdade religiosa não é, nem pode ser, um direito supremo. Desde logo porque os livros sagrados são de interpretação duvidosa. Como lembra Pedro Romano, «historicamente, as más interpretações da Bíblia (e aqui ‘más’ significa ‘interpretações que não coincidem com aquela que os teólogos actuais acham correctas’) já originaram alguns homicídios, algumas centenas de guerras e, aqui e ali, um ou outro extermínio em massa».

O próprio Richard Dawkins no livro A Desilusão de Deus denuncia a perversão da invocação da liberdade religiosa para discriminar os outros. «Não nos deixam dizer: "Se tentarem impedir-me de insultar homossexuais estarão a violar a minha liberdade de preconceito." Mas já é possível afirmar que "isso viola a minha liberdade de religião. Quando pensamos nisto, qual é, afinal, a diferença? Uma vez mais, a religião a tudo se sobrepõe.»

Voltando às farmácias, pergunto-me o que sucederia se um médico ou farmacêutico ateus recusassem um fármaco a um católico porque este sempre pode recorrer aos anjos, arcanjos, santos e, em último recurso, a deus...

8 comentários:

  1. gosto quando aparecem posts que traduzem exactamente o que penso.
    gostava de o mandar discretamente à mãe do meu homem que é professora de ética médica e anda por aí a fazer campanha pela objecção de consciência ...

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  2. O Juramento de Hipocrates tem que ser respeitado pela classe medica. E' que estes dias, estamos no mundo da litigancia...

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  3. A libertinagem, a irresponsabilidade, acima de qualquer valor. Aliás, valor nenhum para todos!

    Não tem um farmacêutico direito a não vender um medicamento que vá contra os seus princípios? Não tem o médico direito a ter os seus princípios acima da sua actividade, ainda que esta seja a médica?

    Um médico ateu, porque ateu é, jamais recusaria um fármaco ou tratamento "a um católico porque este sempre pode recorrer aos anjos, arcanjos, santos e, em último recurso, a Deus..."

    Aliás, acho especialmente curioso que a palavra Deus esteja escrita com minúscula...

    Ai Pedro, Pedro...

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  4. Caro anónimo (17.23),

    Claro que não rejeitaria. Por isso é que pergunto: o que sucederia se rejeitasse?

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  5. O farmacêutico, tal como o médico, existe para prestar um serviço e deve cumpri-lo com competência e eficiência!!!
    Se eu quero um medicamento, o farmacêutico tem de o dar. Não consigo, sequer, conceber a ideia de eu precisar de um medicamento e o farmacêutico não mo vender por imperativos seja de que ordem for.

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  6. Bem entramos por aqui no exagero e no fundamentalismo religioso.Claro que o farmaceutico só tem que vender os medicamentos que lhe pedem. Só uma pergunta se ele tem medicamentos abortivos na farmácia, eles servem para que? Só para uso pessoal e para arranjar a uns amigos?

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  7. Um farmacêutico que pretenda que no seu estabelecimento não se vendam medicamentos abortivos ou, em última análise e em situação limite, um contraceptivo, simplesmente não os tem à venda... Não estou a par da legislação das farmácias, mas julgo que um estabelecimento desses não é obrigado a ter todos os produtos...

    Qual é a dúvida em relação ao seu direito de ter ou não um produto à venda? Afinal, está ou não em liberdade?

    Agora, tal como acontece actualmente com os médicos, também se deve pedir de um farmacêutico que seja objector de consciência que não mude de atitude conforme a situação...

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  8. Ainda por cima é uma falsa questão, Pedro.

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