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O Caso Fernando Charrua

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«Um qualquer cidadão, incluindo as figuras públicas, podem ter conversas privadas, mesmo em locais públicos e, por maioria de razão, nos seus locais de trabalho. A natureza privada de uma conversa não depende do lugar onde a mesma tem lugar, mas sim do clima de reserva em que decorre. E, se a conversa era reservada, é inaceitável que se torne público o seu teor, mesmo que (sobretudo) por um dos interlocutores. O professor Fernando Charrua acreditou que o colega com quem dialogava merecia a confiança de partilhar uma conversa privada e este traiu essa confiança e atraiçoou-o, indo informar um superior hierárquico do teor da conversa. [...]

O direito disciplinar do funcionalismo público não pode ser usado para sancionar um funcionário, por, numa conversa privada, ter injuriado terceiros, incluindo o primeiro-ministro. Este poderá, se o quiser, reagir como qualquer cidadão, no local próprio, ou seja, nos tribunais judiciais, intentando o correspondente procedimento criminal pelo crime de difamação contra quem proferiu as palavras ofensivas. [...]

O direito disciplinar existe para punir infracções disciplinares, ou seja, as que são cometidas por funcionários no exercício das respectivas funções. Mais. A CRP não prevê (portanto, não permite) que as infracções cometidas no exercício do direito de expressão (enquanto direito fundamental) sejam apreciadas em sede do direito disciplinar. [...]

Há no aparelho de Estado, sobretudo na administração pública, pulsões liberticidas e de delação que urge combater. Essas pulsões têm as suas raízes na cultura dominante no Estado Novo. O que havia de pior nesses tempos de tirania não era a actuação repressiva das polícias ou de outros organismos de vigilância e protecção do regime. O que havia de pior era, precisamente, a existência dos "informadores", dos "bufos", ou seja, de pessoas aparentemente normais, que se sentavam à nossa mesa, que entravam nos nossos gabinetes e até nas nossas casas, com quem por vezes se tinha conversas reservadas e até íntimas, mas que, depois, traiçoeiramente, pela calada, iam comunicar essas conversas à polícia ou aos superiores hierárquicos.
É essa actuação ignóbil, é, em suma, essa imensa ignomínia, que urge banir definitivamente da sociedade portuguesa e da administração pública. E a melhor forma de o fazer é, para começar, não compactuar com as suas manifestações em nenhuma circunstância. A melhor forma de combater essa abjecção é fazer precisamente o contrário do que fizeram a directora da DREN (ao instaurar o processo disciplinar a Fernando Charrua) e o primeiro-ministro e a ministra da Educação (ao manterem em funções essa zelosa e perseguidora funcionária)


A. Marinho e Pinto, Público
Via O Jumento

2 comentários:

  1. Tb na U.M. sucedem coisas graves, que põem em causa a Democracia, veja-se os comentários no Blog Elsa Minho sobre o caso da agressão a um Professor.Será que o que se diz merece ser analisado, mesmo a um nível superior?Tb aí são referidos Professores com comportamentos diabólicos, relativamente aos alunos...

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  2. É o governo mais autocrata pós estado novo. Para não dizer fascista!

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