Aprovada ainda em 2008, o dia 1 de Abril foi a data da entrada em vigor de uma reforma do processo civil executivo. Nobre nas intenções de descongestionar os nossos tribunais (e possivelmente será o mais significativo esforço nesse sentido: «[...]com efeito, 41,1 %, 36,1 % e 36,9 % das acções judiciais foram, em 2005, 2006 e 2007, respectivamente, processos executivos[...]» - preâmbulo da lei; estamos a falar sobretudo de bancos, seguradoras, operadoras de telemóveis, etc.), esta lei instituiu o "modelo extra-judicial" (o Juiz Jorge Esteves trata a reforma e explica os vários modelos), que consubstancia uma privatização da justiça (em particular, ler a partir do antepenúltimo parágrafo).
A reforma dependerá da alteração dos contratos por adesão (cujas características são a «pré-disposição, a unilateralidade e a rigidez», TRP) para incluírem estes novos "centro de arbitragem voluntária" como foro (tribunal/local de resolução de litígios) convencionado.
A lei das Cláusulas Contratuais Gerais prevê a potencial nulidade de cláusulas que "prevejam modalidades de arbitragem que não assegurem as garantias de procedimento estabelecidas na lei", mas qual é o entendimento dos tribunais, em particular, do Constitucional? Assegura? Não assegura? Nesta reforma, como será admitido pela maioria dos juristas, o controle jurisdicional é francamente enfraquecido: «cremos que no novo sistema o controle jurisdicional é diminuto e a posteriori, podendo vir a proporcionar graves abusos e violações de direitos do executado», Desembargador Madeira Pinto. Essa dúvida será suportada por um antigo acórdão do Tribunal Constitucional, sobre matéria semelhante:
«[...]“a proibição da ‘indefesa’ que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais [...]. A violação do direito à tutela judicial efectiva [...] verificar-se-á sobretudo quando a não observância de normas processuais ou de princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer o seu direito de alegar, daí resultando prejuízos efectivos para os seus interesses” (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira[...].»
Na altura, o nosso Presidente andava entretido com os Açores e não se preocupou muito com o assunto, que merecia ter sido levado ao Tribunal Constitucional, para sua fiscalização prévia - independentemente de efectivamente ser ou não inconstitucional.
Nem os nossos políticos nem os nossos media, que estão, de uma forma de outra, sob o controlo do tipo de empresas supra citadas, demonstraram particular interesse na reforma em geral, muito menos na questão que refiro. Tal como a reforma penal e processual penal mereceram e, actualmente, o mapa judiciário merece, não teria a privatização da justiça merecido um amplo e digno debate público?
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