Fronteira de Papel
A construção europeia tem aqueles sabidos princípios de fraternidade, assentes no tal modelo social europeu e na promoção da cidadania. A cidadania europeia, sublinhe-se, como é do nosso gosto, num espaço sem fronteiras multicultural e tolerante, onde a prosperidade e a paz têm essa romântica sustentação. Depois há aquele edifício burocrático e o parlamento europeu como Bolhão do nacionalismo latente, parideiro de mais de quantas directrizes e directivas que desculpam más condutas internas, dando aquele tom de Papão à UE.
Nesta semana, do jargão parlamentar, entre a esquerda libertária e a direita conservadora, saiu a menos europeia de todas as directivas. Pelo menos no que aos valores humanistas europeus diz respeito. Está declarada a prisão aos imigrantes indocumentados, de 6 a 18 meses, pelo simples facto de não terem papéis. É esse o crime e tão ao jeito do governo de Sarkozy e outros, que fazem discurso enxertando todo o mal de dentro com quem vem de fora. A esses e aos bem-intencionados empregadores que, assim, arranjam um argumento bem mais consistente na discussão do ordenado à medida – se é que se lhe pode chamar ordenado - com quem já teve de se meter numa bóia, à deriva entre as colunas de Hércules. Quase tão boa a directiva como um subsídio de Bruxelas, já mais apreciado que a couve do sítio.
E nisto esta directiva tem tanto de hipócrita como de ineficaz, porque a jorrada de imigração vai continuar enquanto a União Europeia se mantiver rodeada da muralha do proteccionismo, essencialmente no sector primário, que devastou as economias dos países de onde vêm os que lhe pedem um visto de trabalho. É uma fronteira de papel. Abrir-lhes as portas, até que seria o mínimo que se podia fazer. Ou isso, ou então jogar pelas regras justas do mercado.
Enfim, irónico e desconcertante, como um dos crapichos do modelo social europeu, o proteccionismo subsidiado, pôde resultar num dos maiores problemas sociais na Europa dos últimos anos: a imigração ilegal.
Bom texto. Esclarecedor.
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