Foi reflexão que me surgiu por acaso, a caminho do Congresso de Saúde e Sexo. E escrevo-a agora que me sai pura e, porventura, sem pés nem cabeça. Mas basta olhar a própria figura da república portuguesa, parcialmente desnudada, de mamas ao léu para não perceber onde o sexo cabe ou se mete neste país. A nossa república é na verdade e no seu traço, desinibida, com uma pose naturalista, confortável com o seu corpo e, de bandeira ao ombro, quase que se enrola no mastro como uma stripper. O país real pelo contrário não se veste de burka porque o azul tão pouco lhe combina É antes um negro de véu rendado, xaile preto pela cabeça de dia e no adro, porque pela noite a renda é tecido envolvendo pernas e presa por ligas à cintura.
Verdade é que salvo algumas grandes excepções, que progressivamente se tornaram muitas nas zonas urbanas esclarecidas, é muito pouco usual a discussão sobre sexo e a sexualidade em família na juventude, nem pelo prazer ou função do mesmo. Sempre se deixou a responsabilidade para as forças da natureza da coisa. Nas comunidades rurais então, mais depressa se debatiam as lavouras das filha ou do filho de fulano que propriamente as verdades debaixo das saias e ceroulas. E não admirava a berraria que era sempre que uma adolescente, sem se ter cortado, se via a sangrar pernas abaixo, ou a escandaleira sempre que o pastor menino não se limitava em segurar o cajado. Coisas de pecado, inferno e poucas-vergonhas, que ficavam cegos e com pêlos nas mãos. Erguia-se as mãos à cabeça e lá ia o merendeiro borda abaixo.
E não falando em défice - porque tão pouco me sinto um Teixeira dos Santos, - diga-se em verdade sampaista de que há mais vida para além deste, sobretudo entre as pernas das gerações que se seguem. Tornado como fava o problema, este prende-se na vontade em mostrá-lo e em falar-se nas suas incómodas figuras anatómicas, que tão forçosamente se tapam na cruz ao crucificado. O Estado laico então, alheia-se desse papel e neste país raramente se vai perdendo tempo nas descrições por dentro e por fora, e tão pouco se tenta em falar de como usá-las. Não apenas na sua componente biológica, psicológica mas também no que é na Literatura e restante Arte, na História da Humanidade e como a sua energia está, e digo-o quase à revelia, implícita nas suas derrotas, guerras e conquistas. Até as próprias nações e culturas se desenvolvem nesses conceitos do erguer e do reerguer, das grandes potências…
O facto é que como uma qualquer questão de saúde pública, devidamente informada e esclarecida, o Sexo ou a Sexualidade devem fazer parte dos currículos do Sistema Educativo português, e abrangendo toda a população. É uma questão que não pode ser encarada como menor em democracia sobretudo quando o país se depara com algumas das maiores taxas de incidência de HIV ou de mães solteiras no Ocidente, ou quando há uma panóplia de estereótipos e preconceitos em relação aos comportamentos sexuais, ao papel dos géneros e ao próprio acto sexual. Disto resultam cidadãos que não sabem tirar partido absoluto da sua riqueza e se pouco satisfeitos ou contrariados tão poucos produtivos. Soma-se a este eventual benefício económico com um princípio que tenho em democracia, o do esclarecimento. Porque a informação é a arma de um país livre, e nesta como em muitas questões da sua saúde e da sua vida, os cidadãos e a sociedade portuguesa estão visivelmente desarmados...
Vítor Pimenta
ResponderEliminarNão o conheço mas depois deste texto fiquei sua "fã". Tudo o texto está fenomenal... mas acaba por tocar num ponto crucial para qualquer pessoa, qualquer sociedade evoluir... a informação (conhecimento). se as pessoas soubessem que o conhecimento é a maior arma que temos, tudo seria diferente...
peço desculpa, tem um erro o meu comentário é todo e não tudo
ResponderEliminarMuito bem escrito.
ResponderEliminar«o Sexo ou a Sexualidade devem fazer parte dos currículos do Sistema Educativo português, e abrangendo toda a população.»
ResponderEliminarSe me permite, diria também que outras coisas deveriam ser abordadas no sistema educativo, como a cidadania, participação na democracia ou conhecer o funcionamento do Estado (no fundo, organização do Estado e consciencialização dos direitos, uma espécie de guia prático de direitos para o cidadão comum).
sim, óbvio. Centro-me nas questões da Sexualidade que acho pertinente de momento. E digo que acho que uma escola plural nos conteúdos, que incentive e se centre no aluno na discussão dos temas todos, das matérias e da História, o debate, constrói um cidadão apto e participante per si.
ResponderEliminarE obrigado pelo esforço e o tempo gastos a ler-me o texto.
Excelente texto com boas analogias.
ResponderEliminarOs meus sinceros parabéns.