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Enfim só

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António Barreto escreve no Público (para assinantes) uma das melhores análises que já li sobre o governo e o estilo de José Sócrates:

O estilo de Sócrates consolida-se. Autoritário. Crispado. Despótico. Irritado. Enervado. Detesta ser contrariado. Não admite perguntas que não estavam previstas. Pretende saber, sobre as pessoas, o que há para saber. Deseja ter tudo quanto vive sob controlo. Tem os seus sermões preparados todos os dias. Só ele faz política, ajudado por uma máquina poderosa de recolha de informações, de manipulação da imprensa, de propaganda e de encenação. O verdadeiro Sócrates está presente nos novos bilhetes de identidade, nas tentativas de Augusto Santos Silva de tutelar a imprensa livre, na teimosia descabelada de Mário Lino, na concentração das polícias sob seu mando e no processo que o Ministério da Educação abriu contra um funcionário que se exprimiu em privado. O estilo de Sócrates está vivo, por inteiro, no ambiente que se vive, feito já de medo e apreensão. A austeridade administrativa e orçamental ameaça a tranquilidade de cidadãos que sentem que a sua liberdade de expressão pode ser onerosa. A imprensa sabe o que tem de pagar para aceder à informação. As empresas conhecem as iras do Governo e fazem as contas ao que têm de fazer para ter acesso aos fundos e às autorizações.

Sem partido que o incomode, sem ministros politicamente competentes e sem oposição à altura, Sócrates trata de si. Rodeado de adjuntos dispostos a tudo e com a benevolência de alguns interesses económicos, Sócrates governa. Com uma maioria dócil, uma oposição desorientada e um rol de secretários de Estado zelosos, ocupa eficientemente, como nunca nas últimas décadas, a Administração Pública e os cargos dirigentes do Estado. Nomeia e saneia a bel-prazer. Há quem diga que o vamos ter durante mais uns anos. É possível. Mas não é boa notícia. É sinal da impotência da oposição. De incompetência da sociedade. De fraqueza das organizações. E da falta de carinho dos portugueses pela liberdade.

Via O Jumento

9 comentários:

  1. Isto é aquilo a que Maquiavel chamou de "verità effettuale della cosa". Tal como o citado, também Sócrates verá o seu nome ligado à forma mais maliciosa, ardilosa e cruel de se fazer política.

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  2. O que é que Barreto tem feito para mudar os estilos da governação e da oposição que tanto critica? É através duns artigos
    de opinião? O ex: ministro da agricultura que dê o exemplo e vá à luta, que deixe o sofá e crie alternativas, não custa nada teclar!

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  3. Também li, também gostei. Acontece muito com Barreto: diz o que eu penso.

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  4. Pensei que já se tinham deixado da história da "imprensa livre". Com estes episódios do passado recente, seria de esperar que já tivessem desistido dessa ideia.

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  5. Penso que uma análise destas deve ser o mais difundida possível, por isso penso que não se importará nada, Pedro Morgado, que eu a cole também no meu blogue. Não seria má ideia juntar-lhe mais umas quantas, uma de cada vez para que a leitura não se torne cansativa.
    Quando se sente a liberdade ameaçada, há que ir tomando medidas preventivas que creio poderem ser, por exemplo, os alertas públicos. Depois do caso do professor da DREN, o que mais passei a ver nas escolas foi dedos à frente do nariz em sinal de silêncio sempre que se falava no PM.

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  6. Excelente análise de Antonio Barreto!!! Também não se poderia esperar outra coisa..é sociologo!!! :)

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  7. Este António Barreto é mais um como o Prof.Marcelo, atira-se para a água e depois vem dizer que o empurraram!Tenham vergonha porque andam a cuspir no prato onde comeram!

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  8. Quanto à analise que A. Barreto faz acerca da governaçao de J. Socrates, em nada é uma analise politica-governativa, estou em crer que a intençao dele nao é falar enquanto politico que foi, mas enquanto sociologo que é. Parece-me sim, uma analise da Sociologia do Poder, da relação que o individuo que exerce o poder estabelece com os outros individuos. Está em causa o processo de legitimaçao do poder: o jogo de diferenciaçao que se estabelece entre dominantes e dominados. Uma das vias para que sejam considerados legitimos é a diferenciaçao entre os que exercem poder e os que lhe estao sujeitos. Quem assume o poder pode adquirir uma condiçao que os torna diferentes e superiores aos outros membros da comunidade. E, com J. Socrates, essa legitimaçao do poder mostrasse bastante acentuada. Ele exerce o poder à sua grande vontade e ninguem faz nada. Como diz A. Barreto (e eu partilho da mesmo opiniao) porque a oposiçao é impotente; porque a sociedade é incompetente (e eu diria mais: a sociedade é parasita, é comodista, é passiva, com pouco sentido de mobilizaçao e intervençao na esfera politico-social); porque as organizaçoes sao fracas e porque os portugueses(eu nao diria falta de carinho mas) nao sabem como "usar" a liberdade.
    J. Socrates parece-me aquilo a que G. Balandier denominava de "agente de sacralização do poder". A politica-governativa portuguesa parece um espectaculo dramatico que gira à volta do chefe, de uma personagem que concentra em si todo o poder. Esse culto sagrado do chefe está presente quando o chefe é a figura central que apaga toda a restante estrutura do poder. Socrates sozinho quer fazer a politica de Portugal, daí ser (querer ser) a figura central e unica. Apaga toda a estrututa do poder porque nao dá acçao à oposiçao que vive sem conseguir fazer verdadeira oposiçao.

    O mesmo Balandier dizia "O poder estabelecido unicamente sobre a força ou sobre a violência não controlada teria uma existência constantemente ameaçada. O poder exposto por baixo da iluminação exclusiva da razão teria pouca credibilidade. O poder não consegue manter-se, nem por predomínio brutal, nem por justificação racional. Ele só se realiza e conserva pela produção de imagens, pela manipulação de símbolos organizados num quadro cerimonial."
    No caso do nosso PM parece-me que este poder brutal e racional vai mesmo continuar por muitos anos. À falta de melhor... Não é Marques Mendes, Paulo Portas, Francisco Louçã, Jerónimo de Sousa, ou outro que o vai conseguir destornar da cadeira do poder. Ou a oposiçao faz verdadeira oposição e apresenta lideres fortes e consistentes ou corremos o risco de ter Socrates vencedor em 2009. Ou a sociedade civil se começa a mobilizar e ser mais interventiva, ou continuaremos um país muito central governativamente.

    Eu pessoalmente gosto, no geral, do desempenho governativo do PM.
    A minha intenção aqui foi também fazer uma pequena analise à volta da figura e da forma como J. Socrates exerce o poder e como a sociedade actua(ou nao) perante isso.

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  9. Absolutamente de acordo com António Barreto na´análise que faz.

    Para ser conpetente na reforma da Administração Pública (sim, porque pouco mais Sócrate tem tentado fazer), não é preciso ser déspota.

    Este comportamento de Sócrates e dos seus zelosos acólitos lembra-me o filme alemão "A Vida dos Outros", que narra a vida da sociedade na República Democrática Alemã debaixo da Stasi.

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