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Anos Oitenta

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Ler este post de jcd no Blasfémias e, sobretudo, a caixa de comentários é um cenário absolutamente desolador. Poder-se-ia dizer simplesmente que a homofobia anda à solta. Mas vamos aos argumentos:

1º Dar sangue não é, de facto, um direito e a aceitação de dadores deve basear-se em critérios epidemiológicos e de saúde pública;
2º Ser homossexual NÃO é factor de risco para a contração de NENHUMA doença infecciosa (pelo menos não tenho conhecimento de nenhum estudo credível que o comprove);
3º Existem comportamentos que implicam aumento do risco de se contraírem certas doenças, mas o impacto desses comportamentos é independente da orientação sexual (o risco de contrair HIV no coito anal entre heterossexuais é igual ao risco no coito anal homossexual);

A questão é epidemiológica e, posto isto, defender a exclusão de todos os homossexuais da possibilidade de doarem sangue é puro preconceito. Um cidadão nunca pode ser julgado pelo comportamento dos indivíduos que, com ele, integram determinado grupo mas sim pelos seus próprios comportamentos. Ou deve um recluso ser impedido de doar sangue só porque os níveis de HIV nas prisões são superiores aos do resto da população?

Nos anos 80, convivemos com o que de mais obsceno existe nesta sociedade do políticamente correcto: enquanto meio mundo se ria da praga gay e recusava financiar a investigação da doença, os heterossexuais iam sendo infectados. E, quando se soube que afinal o vírus não era tão discriminador como os homens, surgiram miraculosamente milhões para investigar.

Mas, em pleno século XXI, ainda há quem compare homossexualidade com doenças hepáticas (diz jcd num comentário: «tambem não posso dar sangue. faço parte de um "grupo de risco", na sequencia de uma doença hepática que tive aos ainda nos anos 80. nao e que haja grande problema, a possibilidade de transmissão é baixa. mas os médicos proibiram-me expressamente a dádiva de sangue, para minimizar os riscos para teceiros. e agora, devo gritar pelo meu direito?»).

Quando leio palavras destas compreendo ainda melhor que os infectados com HIV continuem com a máscara sobre o rosto. Não vá esta gente chamar-lhes paneleiros...

Ligações
Estado à solta, O direito de dar sangue, o direito do joão miranda à ignorância e ao disparate, Esta não é fracturante, Good liberals, Cada um sabe de si e deus, de ninguém..., Homossexualidade e outros factores de risco na doação de sangue (3)

16 comentários:

  1. Eu continuo a achar a proibição aceitável. O problema é o teu ponto número 2. Ser homossexual implica uma maior probabilidade de contracção de HIV: vê aqui (e sim, é a Wikipedia, mas essa secção tem uma série de links para fontes externas que podem ser consultadas para verificação da veracidade dos factos).

    E sim, um recluso deve ser impedido de dar sangue, exactamente porque os níveis de infecção na prisão são superiores. É meramente estatístico, não é discriminativo.

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  2. Passado de lado o rótulo disparatado, chamo-lhe a atenção para:

    1º - Convinha que reparasse que é justamente esse o meu argumento. A questão é técnica.

    2º - Também tem razão. Ser, por si só, não é nada. A prática de actos homossexuais entre dois homens, sem protecção adequada, é que é um risco grande para a contracção da doença. Como mostram todas as estatísticas, que são faladas no debate que considera desolador.

    3º Está absolutamente enganado. Os riscos são muito, muito diferentes.

    Utilizando os números de França, a percentagem de homossexuais infectados é de 12%. Na restante população é de 0,2%

    Numa relação, a probabilidade de pelo menos um dos dois estar infectado é:

    p=a*(1-b)+b*(1-a)+a*b

    em que a e b representam a probabilidade do parceiro 'a' e do parceiro 'b' estarem infectados.

    Num casal heterossexual, a=b=0,2%. A probabilidade de haver pelo menos 1 infectado é de 0,4%.

    Num acto homossexual masculino, a=b=12%. A probabilidade de pelo menos um membro do casal estar infectado é de 22,5%.

    O risco de um dos parceiros estar infectado, numa relação homossexual masculina é cerca de 56 vezes superior.

    A questão é prática. E é também por isso que não é recomendável recolher sangue nas prisões e quando se re. O risco é elevado. E de pessoas que viajaram para alguns países de África nos últimos tempos, independentemente do que andaram por lá a fazer. E de toxicodependentes.

    Já se esqueceu dos anos 80? Do sangue infectado, dos hemofílicos? Foi justamente o estabelecimento de normas agressivas de selecção, excluindo todos os grupos em que o risco era elevado, que permitiu o regresso à segurança das recolhas.

    Claro que se for fácil, rápido, eficaz e economicamente viável testar submeter todo o sangue doado a testes, o problema está resolvido. Enquanto tal não for possível e houver dúvidas, prefiro um critério largo e seguro e estou-me nas tintas para os pruridos de 'a' ou 'b'.

    E não estou a comparar homossexualidade com doenças hepáticas. O Pedro é que está. Também não tenho nenhuma doença, como 90% dos homossexuais não têm. Simplesmente faço parte de um grupo de risco elevado, neste caso para a transmissão de hepatites, mononucleoses e outras doenças relacionadas com o virus Epstein-Barr. Por isso fui aconselhado a deixar de dar sangue. Na altura fui mesmo proibido, agora é que é só aconselhado. Fui dador regular até essa altura. A comparação é entre riscos e não entre doenças.

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  3. Desculpem mas não consigo concordar. Uma pessoa por ser homossexual não tem risco acrescido de contrair HIV. Pode ter se tiver prática de actos homossexuais.

    O que vocês estão a defender é o regresso aos grupos de risco, há muito abandonados. O que conta são os comportamentos e não os rótulos.

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  4. Caro JCD,
    Relativamente ao ponto 3, mantenho o que afirmei: um coito anal entre um homem e uma mulher tem exactamente o mesmo risco de transmissão que entre 2 homens.

    Quanto às estatísticas, como também deve saber, o número de homossexuais está, por razões óbvias, claramente subestimado.

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  5. Pedro, tem razão. Como alguém dizia no Blasfémias, se o homossexual for virgem, não há problema.

    Em relação ao ponto 3., julgo que demonstrei que não tem razão. Se mesmo assim acha que o risco é idêntico, parece-me que já estamos no campo de preconceito.

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  6. Caro jcd,
    Estamos a falar de coisas diferentes... Eu percebi muito bem a sua argumentação sobre o ponto 3 e concordo com ela. Eu refiro-me ao risco biológico.

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  7. No entanto, caso o inquérito questione a existência de comportamentos de riscos (múltiplos parceiros sexuais, não utilização de preservativos, etc.), então a questão da orientação sexual deixa de ser pertinente, uma vez que a incidência de DSTs é independente da orientação sexual, sabidos os comportamentos sexuais (note-se que caso os comportamentos sexuais sejam desconhecidos, a incidência é dependente da orientação sexual).

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  8. Já tinha dito na caixa de comentários no Blasfémias sobre esses mesmos posts que «têm sido de um cariz discriminatório e homofóbico gritante...»

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  9. Eu refiro-me ao risco biológico.

    Evidentemente, o que muda é a probabilidade de um dos dois estar infectado.

    É o mesmo que dizer que a probabilidade de um alcóolico e de um não alcoólico terem um acidente é a mesma, desde que ambos estejam sóbrios.

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  10. Eu só pergunto uma coisinha. Se um homossexual tem uma relação estável, só tem um parceiro sexual e não assume comportamentos de risco porque é que tem de ser excluido?? Que eu saiba quando se vai doar sangue além da entrevista (na qual sempre é possível falsear as respostas)ainda nos é retirada uma amostra para verificar se existem doenças passíveis de transmissão.

    Sendo assim acho que é preconceito.

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  11. Eu sou tatuado e não posso dar sangue!!!
    Abaixo a discriminação dos tatuados!!!
    Abaixo a tatuofobia!!

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  12. leio o que o jcd escreve e pasmo. 'Claro que se for fácil, rápido, eficaz e economicamente viável testar submeter todo o sangue doado a testes, o problema está resolvido. Enquanto tal não for possível e houver dúvidas, prefiro um critério largo e seguro e estou-me nas tintas para os pruridos de 'a' ou 'b'.'

    o jcd anda há dias a escrever sobre recolha de sangue e segurança transfusional, a visitar sites do cdc e mais não sei quantas entidades sanitárias de não sei quantos países à procura de números sobre prevalências de hiv nos homens que têm sexo com homens, e ainda não sabe que TODO o sangue colhido é testado? é de facto extraordinário.

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  13. "e ainda não sabe que TODO o sangue colhido é testado? é de facto extraordinário."

    Infelizmente não existem testes com uma eficácia de 100%.

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  14. Não é isso que está em causa, Bruno. Para quem tanto pregou sobre o assunto exigia-se que, no mínimo, o jcd soubesse do que falava e as palavras deles denotam profunda ignorância sobre o tema.

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  15. bruno gonçalves, no que respeita aos testes para o hiv, a fiabilidade dos actualmente existentes é muito elevada. a questão que foquei, porém, não era a da fiabilidade dos testes, mas a da existência obrigatória de estes para o hiv (e não só) para todo o sangue colhido. isto é assim desde os anos oitenta, que diabo. e à medida que novos testes foram surgindo, como foi o caso do teste para a hepatite C, em 1992, a obrigatoriedade de os fazer foi imposta.

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  16. pior ainda "
    Já se esqueceu dos anos 80? Do sangue infectado, dos hemofílicos? Foi justamente o estabelecimento de normas agressivas de selecção, excluindo todos os grupos em que o risco era elevado, que permitiu o regresso à segurança das recolhas.", ou seja, nem tem consciência que o que esteve na origem do drama dos hemófilicos foram lotes de sangue não devidamente testados. é, de facto, extraordinário.

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