Avenida Central
| Partilhar
Avenida do Mal

Saúde Privada: o Paralelo dos Sistemas

Os serviços de saúde privados, não vendendo o que vende a Banca norte-americana, têm em Portugal um funcionamento em tudo semelhante. Só se equilibram e sobrevivem em Mercado porque o fazem sobre a rede de amparo do contribuinte. Todo o serviço privado é tido, na cabeça de todos, como caro mas de qualidade e - fora quaisquer milagres de gestão - altamente rentável, ao contrário dos hospitais públicos que acumulam passivos. Esta prosperidade do privado é no entanto possível porque todo ele é dependente do que o SNS se tornou – um torniquete enorme e confuso para o financiamento de toda e qualquer actividade de saúde.

O exercício mental não é muito complicado. As concepções socialistas clássicas que fundaram o Serviço Nacional de Saúde(SNS) exigiram uma certa rigidez ideológica na discrepância dos ordenados a pagar aos profissionais, quanto mais não fosse no limite do tecto absurdo do ordenado do Presidente da República.

Por outro lado, de modo a manter a moral e a motivação, de médicos sobretudo, segurando-os no SNS, o sistema permitiu um trabalho híbrido entre o público e o privado, possibilitando deste modo a “dignidade remuneratória” da profissão tradicionalmente liberal da medicina. Poucos são, na realidade, os que trabalham em regime de exclusividade.

O problema é que com o aumento do recurso e dos níveis de exigência aos cuidados de saúde, esta perversidade sustentou a emergência de um Serviço Privado de Saúde mais organizado e moderno, paralelo ao SNS que gradualmente se tornou dispendioso, pouco eficiente e gerador crescente de insatisfação dos utentes.

De verdade, e por este caminho, o sector público limitar-se-á praticamente a suportar a formação dos profissionais de saúde, desde a entrada na Universidade à conclusão da Especialidade, fazendo dos seus hospitais e centros de saúde meros laboratórios com a ralé. O sector privado depois só tem de aliciar os melhores profissionais formados para o seu quadro, onde recebem maior remuneração, despojando o Serviço Nacional de Saúde dos melhores médicos e por conseguinte, obrigando-o a pagar – a preço altamente especulado – os serviços que não tem capacidade de dar resposta.

Assim sendo, não deixando o hospedeiro morrer por agora, o sector privado engorda parasita sobre um Serviço Nacional de Saúde moribundo que só respira ainda à custa de um Orçamento de Estado sempre disponível para o financiar. E quando não o pode, obriga-o a amputar-se de serviços importantes às populações menos abastadas.

13 comentários:

  1. Mas não é suposto o Estado financiar o Serviço Nacional de Saúde?Se este apoio falha é o fim, certo?Se é universal é para dar prejuizo e não lucro.Já só fosse para alguns - os poderosos - daria lucro, certamente...

    ResponderEliminar
  2. "quanto mais não fosse no limite do tecto absurdo do ordenado do Presidente da República."

    Os médicos do SNS deveriam ganhar mais que o PR!

    Quando é que os médicos que fogem ou fugiram para o privado pagam a formação aos contribuintes?

    O Estado dá-lhes o curso e estes oportunas entregam-se ao privado para ganhar mais.

    Excelente juramento de Hipócrates.

    ResponderEliminar
  3. Caro José Manuel Faria,

    O Estado dá-lhes a formação como dá a muitos outros profissionais. Alguns médicos até têm muitas razões para ser criticados, mas essa crítica não tem fundamento.

    ResponderEliminar
  4. Caro Pedro;

    Sabes que a medicina é a actividade mais nobre do ser humano. Os médicos deveriam ser mais solicitos, compreensivos e aplicar o seu "sacerdócio" com menos ganância.

    ResponderEliminar
  5. José Manuel Faria.

    O julgamento de Hipocrates nada tem que ver com a fidelidade ao serviço público, nem quis passar uma imagem de mercenário com o "tecto absurdo". Simplesmente a actividade médica deve ter um preço justo dada a responsabilidade, e ser devidamente regulada quer pelos utentes quer pelos colegas.

    No texto apenas tento dar uma explicação para a recente deriva orçamental do SNS e para onde pode levá-lo.

    ResponderEliminar
  6. Caro José Manuel Faria,
    A irascibilidade com que fala dos médicos não ajuda ao debate.

    Os médicos têm direito a ser remunerados pelo seu trabalho e a ser castigados pelas suas negligências. Competência (no que se inclui a capacidade de ouvir atentamente os doentes e ajuda-los em todas as suas dúvidas) é o que todos devemos exigir aos médicos.

    Como bem diz o Vítor Pimenta, é um grande equívoco julgar que o Juramento de Hipócrates é um contrato com o Estado. Bem pelo contrário, é um contrato com as pessoas. E as pessoas têm o direito a ser tratadas no sistema público e no sistema privado.

    ResponderEliminar
  7. Eu não tenho queixas do sector privado de saúde. Em 1996 foi um extraordinário médico no seu consultório privado e depois no hospital que me salvou. Um médico que aos domingos visitava os seus doentes e atendia o telefone particular.

    9 anos depois tive excelentes médicos no hospital estatal e outros péssimos que quase me deixavam ir.

    Infelizmente, e o Pedro sabe tenho tido muito azar em questóes de saúde. Conheço o "ambiente" muito bem.

    Por isso falo da importância dessa profissão.

    E fico triste quando vejo centenas de médicos a sairem do público para o privado quando sabemos da sua necessidade, principalmente para os mais desfavorecidos.

    ps. Quantas vezes ouvi da boca de utentes, " Há uma extensa lista de espera, mas resolvo o "assunto" em 8 dias na minha clínica", tanto nos centros de saúde como nos hospitais públicos.

    Da minha parte termino o assunto.

    ResponderEliminar
  8. Na Bélgica, onde o salário mínimo é muito superior ao Português, o preço médio da consulta privada é inferior ao que se verifica em Portugal. Porque será?

    ResponderEliminar
  9. «O Médico não deve considerar o exercício da Medicina como uma actividade orientada para fins
    lucrativos, sem prejuízo do seu direito a uma justa remuneração, devendo a profissão ser
    fundamentalmente exercida em beneficio dos doentes e da comunidade.»

    Código Deontológico da O.M.

    Será que cumprem este pressuposto os médicos que de uma forma mercenária corrompem o SNS, através de associarem-se a empresas de trabalho que vendem serviços médicos? ou serão que vão atrás de uma remuneração merecida?

    E aqueles que trocam o SNS pelo privado à procura de mais rendimento, não estarão a corromper o seu próprio código? ou serão que vão atrás de uma remuneração merecida?

    ResponderEliminar
  10. Caro Marco,

    Bem sei que o conceito de "justa remuneração" é muito discutível, mas certamente está muito longe daquilo que, pelo que tens escrito, consideras justo.

    Qual é o problema de alguém procurar melhores condições de vida? Há nisto alguma corrupção? Só no vosso cérebro...

    ResponderEliminar
  11. Caro Pedro,

    dispenso juízos e insinuações sobre aquilo que não penso ou que julgas que eu penso.

    Quanto ao que considero "justo" ou não, sei-o eu e o resto cabe a cada um decidir.

    O que considero "corromper", no âmbito do que se está a discutir aqui, são as consequências advidas para o SNS dos profissionais de saúde que trocam a sua ética profissional por mais rendimento.

    Nisto acho justo, "no meu cérebro", que se considere estes profissionais como mercenários -principalmente aqueles que estão indisponíveis para trabalhar pelo SNS no seu hospital e depois, através de uma empresa de trabalho, já estão disponíveis por um valor exagerado.

    Agora se no teu "cérebro" aceitas este tipo de situação e a intitulas de "procurar melhores condições de vida", desculpa-me, mas eu não.

    ResponderEliminar
  12. Apraz-me ler o estalinismo selectivo das tuas palavras. Estalinismo, mas so para os médicos, claro!

    Não me parece que procurar melhores condições de vida seja anti-ético. Pelo contrário e como sempre tenho dito, parece-me que acabar com as carreiras da função pública foi altamente gravoso para o SNS porque a precarização do emprego levou os médicos a procurarem formas mais seguras de ganhar a vida.

    Olha, o Cristiano Ronaldo também andou nas escolas que todos pagámos e agora foi ganhar a vida para Inglaterra. Mercenário? Lamento mas não tenho uma visão tão comunista do mundo.

    ResponderEliminar
  13. Pedro, não me julgues pelo aquilo que tu pensas que eu penso (outra vez).

    Considero mercantilismo (outra vez) a venda (que acontece) da ética profissional por mais rendimento.

    Quanto à supressão da carreira da função pública- tens razão.

    Quanto ao Estalinismo selectivo (?) que tu dizes que eu possuo e a forma comunista de ver mundo- mais uma vez me julgas sem saber- é simplesmente uma opinião que não partilho.

    Não me atrai o Estalinismo nem os seus métodos e muito menos tenho uma visão comunista do mundo. Aquilo não era um socialismo real mas sim irreal.

    Abraço.

    ResponderEliminar

Antes de comentar leia sobre a nossa Política de Comentários.

"Mi vida en tus manos", um filme de Nuno Beato

Pesquisar no Avenida Central




Subscreva os Nossos Conteúdos
por Correio Electrónico


Contadores