A entrada da semana passada justificou alguns comentários. Num deles, um leitor criticou o meu argumento principal, classificando-o de «puramente económico». Concordo no essencial: é óbvio que era um argumento económico. Mas isso só é problema para quem pensa que a economia trata do dinheiro.
A economia não trata do dinheiro. Trata das escolhas individuais num contexto de bens escassos. O dinheiro é apenas uma forma fiável de aferir o valor que cada um dá a cada bem. Os preços reflectem a procura e a oferta: as preferências dos que compram e as disponibilidades dos que vendem. São indicadores das disponibilidades da economia e das prioridades das pessoas.
Num café com fumo, há um custo óbvio para aqueles que não fumam: para além do incómodo, há o problema da saúde. E a forma como cada pessoa reage a este custo diz muito acerca do valor que atribui à sua própria saúde. Quem atribui pouco valor, frequenta o café à mesma. Quem atribui mais valor pode reduzir o tempo de permanência. E quem atribui muito valor nem põe lá os pés.
Claro que é preciso olhar para o outro lado: o valor que cada um atribui à frequência do café. Quem não aprecia muito, não terá problema em deixar de o frequentar. Mas quem não passa sem os quinze minutos de relaxe diário, estará disposto a gastar um pouco mais de tempo e gasolina e visitar um café sem fumo, ainda que mais distante. Gasta mais, mas compensa.
Num sistema livre, a oferta de cafés tende a acomodar-se às preferências dos consumidores. Quando a saúde é muito valorizada, a afluência aos cafés com fumo desce e o lucro dos cafés sem fumo sobe, estimulando a abertura de mais cafés deste género. A existência de poucos cafés sem restrições ao tabaco e os lucros normais dos que o proíbem são um reflexo do pouco incómodo que o tabaco causa ao consumidor médio ou um espelho do pouco valor que cada pessoa atribui à própria saúde.
O que a Lei do Tabaco faz é acabar com os custos dos não fumadores. Mas, como a manta não estica, tem de ir tirar a outro lado. Neste caso, vai buscar ao bolso dos proprietários e dos empregados de cafés. É possível dizer que a função do Governo é zelar pela saúde dos cidadãos e que por isso todos os custos se justificam; mas fica por explicar por que deveria a Lei atribuir à saúde dos consumidores um valor que os próprios não atribuem.
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Acredita sinceramente que, caso fosse possível aos donos dos cafés optar entre estabelecimento para fumadores e não fumadores, haveria alguma percentagem significativa que optaria pelos não fumadores? Ou não seria de esperar que a grossa maioria optasse pelos fumadores, eliminando a possibilidade de escolha? Resumindo, se fosse possível aos comerciantes optar, até que ponto não ficaria tudo na mesma?
ResponderEliminarestá visto.
ResponderEliminareste pedro romano fuma!!!
Excelente texto humorístico!
ResponderEliminarGosto especialmente da parte em que gasta mais GASOLINA para encontrar um ambiente impoluto.
Paulo J. Vilela
Faço plágio de uma pergunta de um míudo do sétimo ano da escola de Gualtar num debate, hoje, sobre este tema.
ResponderEliminar"Mas é mais importante o dinheiro ou a saúde pública?"
Pedro Antunes
«Ou não seria de esperar que a grossa maioria optasse pelos fumadores, eliminando a possibilidade de escolha?»
ResponderEliminarE nunca se perguntou por que será que a maioria opta por não proibir o fumo?
«Excelente texto humorístico!Gosto especialmente da parte em que gasta mais GASOLINA para encontrar um ambiente impoluto.»
Suponho que o Paulo se desloque a pé quando quer sentir o ar puro da Serra da Estrela.
«Faço plágio de uma pergunta de um míudo do sétimo ano da escola de Gualtar num debate, hoje, sobre este tema. "Mas é mais importante o dinheiro ou a saúde pública?"»
Depende. Mas para os clientes dos bares, parece que o dinheiro é bastante mais importante.
«este pedro romano fuma!!!»
Claro, e se eu criticar Guantanamo só posso ser terrorista.
"E nunca se perguntou por que será que a maioria opta por não proibir o fumo? "
ResponderEliminarSim já. Acredito que a esmagadora maioria não o proibiria por medo de perder clientes não dando aos não fumadores possibilidade de escolha. Em suma continuaria tudo na mesma e a lei não passaria de um enfeite.
!Mas quem não passa sem os quinze minutos de relaxe diário..."
Para muitos, a frequência de um café não é só um prazer, é também uma necessidade. Existe imensa gente que almoça em cafés e restaurantes porque não tem possibilidade de o fazer em casa. Até aqui essas pessoas eram obrigadas a fazer refeições em ambientes de fumo e por muita gasolina que gastassem não encontrariam um sitio onde houvesse alternativa.
Repito, até que ponto essa situação se alteraria se fosse dada opção aos comerciantes?
«Sim já. Acredito que a esmagadora maioria não o proibiria por medo de perder clientes não dando aos não fumadores possibilidade de escolha.»
ResponderEliminarJá reparou que se o fumo causasse tanto transtorno como diz, bani-lo seria uma forma de ganhar clientes e não uma maneira de os perder?
«Até aqui essas pessoas eram obrigadas a fazer refeições em ambientes de fumo e por muita gasolina que gastassem não encontrariam um sitio onde houvesse alternativa.»
Está a dizer-me que em toda a cidade não se arranjava um único restaurante onde fosse proibido fumar? Eu conheço uns três só na minha zona.
«Repito, até que ponto essa situação se alteraria se fosse dada opção aos comerciantes?»
Mas eu não digo que a situação se alterasse. O que eu digo é que a situação reflecte as preferências dos consumidores e as disponibilidades da economia.
E Quem acha que as preferências das pessoas não estão a ser respeitadas devia abrir um espaço sem fumo. Assim, em vez de gastar latim em caixas de comentários, ganhava um balúrdio conquistando quota de mercado.
"se o fumo causasse tanto transtorno como diz, bani-lo seria uma forma de ganhar clientes e não uma maneira de os perder?"
ResponderEliminarPorque é que nos damos ao trabalho de regulamentar as condições de higiene em cafés e restaurantes? Afinal as pessoas só frequentam os ditos cujos por iniciativa própria e geralmente os cuidados de limpeza até são patentes aos olhos.
"Está a dizer-me que em toda a cidade não se arranjava um único restaurante onde fosse proibido fumar? Eu conheço uns três só na minha zona."
Considere-se um privilegiado. Mas lembre-se que nem toda a gente vive em Braga.
"Quem acha que as preferências das pessoas não estão a ser respeitadas devia abrir um espaço sem fumo. Assim, em vez de gastar latim em caixas de comentários, ganhava um balúrdio conquistando quota de mercado."
Sim. E como acho que há poucos médicos em Portugal, pouca cultura e poucas empresas de tecnologia vou abrir também uma escola de medicina, uma casa de artes e espectáculos e uma fábrica de telemóveis!
E por quem é! Se considera que estou a gastar latim a comentar a sua crónica não o voltarei a fazer!
Cumprimentos
Caro Pedro Romano, o Estado é o prestador de serviços de saúde por excelência, e na avaliação dos custos tem toda a legitimidade de minimiza-los com a promoção da saúde e com a restrição de práticas, que não são tão voluntárias quanto isso, com leis que apesar de tudo não chocam com o princípio das liberdades individuais. Pena que o fumo do tabaco seja apenas uma pequeníssima parte do abuso do espaço comum.
ResponderEliminar«Porque é que nos damos ao trabalho de regulamentar as condições de higiene em cafés e restaurantes?»
ResponderEliminarFaço essa pergunta todos os dias. A ASAE não pode chatear as grandes cadeias, que já cumprem normas de higene superiores às exigidas. E quando ataca a tasca da esquina, os clientes perdem a cabeça e pedem liberdade. Não há direito.
«Considere-se um privilegiado. Mas lembre-se que nem toda a gente vive em Braga.»
Acho difícil acreditar que Braga é a única cidade com restaurantes que proibem fumo durante as refeições. Mas se for verdade,
penso que diz muito do valor que os habitantes das outras cidades atribuem à própria saúde.
«Sim. E como acho que há poucos médicos em Portugal, pouca cultura e poucas empresas de tecnologia vou abrir também uma escola de medicina, uma casa de artes e espectáculos e uma fábrica de telemóveis!»
Se tiver recursos para isso, por que não? Mas não tenha a pretensão de saber qual o número exacto de médicos, cultura e tecnologia de que a economia precisa. A resposta final será dada pelo mercado.
«E por quem é! Se considera que estou a gastar latim a comentar a sua crónica não o voltarei a fazer!»
De facto, penso que está a perder o seu tempo a comentar uma crónica tão insipiente. Mas acho que deve comentar à vontade. Eu não pretendo obrigar os outros a valorizar o tempo da mesma forma que eu :)
«Caro Pedro Romano, o Estado é o prestador de serviços de saúde por excelência, e na avaliação dos custos tem toda a legitimidade de minimiza-los com a promoção da saúde»
Mas isso deixa por responder a questão fundamental: por que deveria o Estado atribuir à saúde do contribuinte um valor que o próprio não atribui?
E levanta outra questão. Qual a legitimidade da sobrevalorização de um bem (a saúde) quando essa sobrevalorização implica o prejuízo de actividades devidamente valorizadas.