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[Avenida do Mal] O Hospital Voador

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Não sei quem é, nem de onde surgiu, este Bastonário interino, se por obra e graça da trapalhada das eleições para a Ordem dos Médicos, se apenas como bobo oportuno na circunstância, em misto de Carvalho da Silva com Manuel Arriaga. Mas verdade é que se encaixa bem no circo voador montado à porta das especializadas urgências de aldeia, essas miniaturas de Hospital Central e triagem ao desassossego de gente com tensões por medir. A ele se juntam, como no Portugal no Coração, caciques locais, marias vai-com-as-outras e Luís Filipe Menezes, no seu híbrido de autarca à la Ferreira Torres e líder de oposição, exibindo a sua carpideira figura para as câmaras, - as de filmar, claro está -, chupando cada segundo a teimados minutos de fama. Todo este coro de baboseira, mais irritante que o Infantil de Sant'Amaro de Oeiras, espicaçada pela mouca reforma do Governo no sector da Saúde.

Vivo aliás, no fim-de-semana e férias, como vivi mais de dois terços plenos da minha vida em terras de poucos recursos de saúde. Poucos, porque as pessoas medem-nos aqui em número de consultas, número de médicos e enfermeiros, quantidade de horas a apanhar soro. Medem a Saúde pelas maleitas. Ou então, porque os dias na aldeia são tão aborrecidos que tem de se fazer alguma coisa para o arrastar da horas, e nada como deslocar o banco de jardim, nas cartas e no croché, para plena sala de espera de Centro de Saúde. Aqui, onde estarão mais socorridas, se por infortúnio biológico ou desígnio divino, de repente lhes der alguma coisa pelo braço ou pela perna a diante, se uma trombose ou um desmaio de boca espumada, e onde facilmente se pode montar o teatro da desgraça. É que nestas coisas de português entranhado vale mais esperar pela morte que fazer pela vida.

E aqui a comunicação social tem tido um papel muito pouco higiénico. Mexe e remexe nas notícias de gente que morreu em macas no corredor de urgências e esquece-se também que a menor eficiência passa igualmente pela falta de consciência dos próprios utentes do Serviço Nacional de Saúde, e como estes o sugam até ao coma. Exemplos estes, que não tendo sido notícia como deviam, ficam bem desnudados no recente congestionamento das urgências pediátricas de Faro, em vésperas do Ano Novo, quando mais de uns quantos pais decidiram levar os rebentos para check up ao hospital antes de os entregarem aos avós para passar o Reveillon de espumante na boca e livres das birras e dos supositórios dos pequenos...

O mais esperneante da situação é que as reformas necessárias à optimização do sistema nacional de saúde são urgentes! E passam, em boa verdade, por eliminar estas alfandegas intermédias ou primárias de falsa segurança. Não há, na verdade, muito que se possa fazer em casos urgentes (realmente urgentes) nos hospitaizinhos de aldeia. É engonhar em burocracia e medicina remelenta, minutos ou horas preciosos para uma abordagem multiespecializada num Hospital Central. E não há volta a dar, por muito que se queira fazer destas revoltas de Maria da Fonte, Patuleia de oposição contra governo.

Na batalha, diga-se antes que as duas facções estão erradamente dispostas. Porque uma reforma estrutural da Saúde tem de envolver os seus profissionais, e estes têm de se envolver activamente nela. E se por um lado, Correia de Campos tem teimado pelo autismo com estes resultados à vista. Por outro lado, o emperro do real coorporativismo vê-se por si na pasmaceira de repartição pública, pelo menos possível, em que se tornaram muitos dos Centros de Saúde. Locais estes onde a negligência, da função de educação para a saúde, não ajudou a incutir uma cultura de autonomia e responsabilidade nos portugueses, e que resultaram nestes pesados e vendavais custos na eficiência de o Serviço Nacional de Saúde.

4 comentários:

  1. Cuidado com o conceito de eficiência no SNS. A saúde deveria ser gratuita para os portugueses (socialismo a sério), o SNS deve dar prejuíso ( e os nossos impostos), não gostei da referência a Carvalho da Silva ( o meu candidato presidenciável).

    Pela 1ª vez não estou de acordo com o texto (há sempre uma 1ª vez), bem escrito.

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  2. Caro JMF.
    Eu também não entendo que o SNS tenha de dar lucro, pelo contrário. Deveria ser optimamente gratuito.
    Apenas contesto, por uma questão ecológica mais que económica, que os recursos em saúde não devem ser desperdiçados por muita obrigação socialista, na tradição europeia do modelo social, de garantir o acesso a todos.
    O que eu pretendia transmitir é que mesmo nesta área é preciso haver uma racional gestão dos recursos, humanos e materiais, porque por si a má conduta leva a que muitos não consigam ter o acesso a que tem direito. Os CSaúde não funcionam como deviam devido ao laxismo e à irresponsabilidade.

    E quanto à questão das urgências, mantenho-me contra a abertura das mesmas, com essa ou outra denominação em Centros de Saúde, sem as mínimas condições físicas e humanas para as acudir atempada e eficazmente a uma verdadeira urgência.

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  3. Tiro o meu carapuço ao excelente texto que acabo de ler!
    Manter Médicos em Centros de Saúde e Hospitais (mesmo distritais) como se sinaleiros fossem, pois as atitudes terapêuticas de urgência ou emergência não as podem tomar (por falta de meios e equipamento ou competência) é uma aberração.
    Neste país toda a populaça se convenceu que tudo é patologia urgente, tudo tem que ser tratado na hora, por culpa dos Médicos e suas organizações bem como dos destravados políticos que deveriam no mínimo ter senso. Quando ficam doentes não vão ao centro de saúde, telefonam ao correlegionário político da urbe próxima com grande hospital e aí vão eles. O Sr presidente de qualquer município vizinho de Braga não vai para o seu centro de saúde avança logo para Braga para o Hospital Central nem em clínica passa (então se for patologia do foro cardíaco ou neurocirurgico) até do alto minho e trás os montes aparecem.
    O Povo quando é mesmo urgente desenrrasca-se! porque em Portugal o que melhor sabemos fazer é desenrrascar, mas depois. ..reclama-se muito.
    Isto dsa urgências é um problema técnico e por técnicos deverá/ia ser resolvido!!!
    Toninho Regadas

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  4. «Não há, na verdade, muito que se possa fazer em casos urgentes (realmente urgentes) nos hospitaizinhos de aldeia. É engonhar em burocracia e medicina remelenta, minutos ou horas preciosos para uma abordagem multiespecializada num Hospital Central.»

    Indeed! Isto é uma espécie de reedição do debate sobre o fecho das maternidades. Na altura argumentava-se, também, por esta via, das urgências - estiveram particularmente em voga as notícias sobre partos dentro de ambulâncias. Mas a verdade é que os casos, também, verdadeiramente urgentes eram sempre recambiados para um hospital central. Foi o caso de Barcelos, que nos é mais próximo. Os casos que precisavam de vir para Braga, já vinham para Braga. O resto dos argumentos resumiam-se a um comodismo. À vontade que tinham em ter os bebés na terrinha deles. Como isso é absolutamente insignificante e contrário à racionalização do SNS, optou-se, bem (apesar de um ou outro caso ser mais questionável, por não se resumir a estes argumentos), por fechar.

    «E aqui a comunicação social tem tido um papel muito pouco higiénico. Mexe e remexe nas notícias de gente que morreu em macas no corredor de urgências e esquece-se também que a menor eficiência passa igualmente pela falta de consciência dos próprios utentes do Serviço Nacional de Saúde, e como estes o sugam até ao coma.»

    O caso da maca, independentemente da gravidade que tem, por comparação com os partos em ambulâncias, é um aproveitamento, da CS, idêntico, sensacionalista.

    Correia de Campos, talvez com o autismo que referes, tem tentado fazer o que é preciso fazer. Mas note-se a total ausência quer da Ordem dos Médicos quer a dos Enfermeiros. Não se vê, não se ouvem ideias, nesta altura reformista. Vão-se ouvindo críticas, após elas estarem já em curso, a todo o vapor. Mas se existe uma ausência de debate. Se existe o autismo do Ministro, isso também se deve às corporações dá área.

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