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[Avenida do Mal] Um Presépio de Duas Marias

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O contexto é ideal para abordar assuntos de família, se bem que me pode custar a heresia uns dias no Inferno'arder. Sobretudo em países em que estas se montam em lógicas de presépio franciscano e assim se fazem por preservá-las, ainda que por mais evidentes as inconstitucionalidades de um modelo compulsivamente inflexível. Não que eu defenda a inclusão do burro ou da vaca na boda e que se levem os animais ao altar do registo civil. Tão pouco que sejam feitas de homens e mulheres com respectivas bonecas ou bonecos de plástico.

Na sociedade espanhola ensaiam-se livros infantis abordando outras realidades familiares para lá da formula judaico-cristã tradicional. Crianças com pais e mães em dobro e outros pela metade, formas diferentes de amor. Por cá fazem-se Constituições para vender modernidade e humanismo lá fora, porque cá dentro vai o mesmo de sempre na esfera burocrática e política, ambas sem vontade nenhuma para não atrapalhar a vida dos seus cidadãos e facilitar a de outros de menos normalizada.

Numa altura em que o desejo de casamento, nos seus benefícios fiscais e defeitos, de Teresa Pires e Helena Paixão está por decidir pelo Tribunal Constitucional, uma coisa eu tenho como certa: aquelas duas mulheres são uma família. E certamente com mesmos stresses e quenturas da época. Isto quer queira código civil quer não e mesmo que os juízes do mesmo tribunal tratem de parir um acórdão redundante ou que o adiem por tempo indeterminado, para não causar o terramoto de epicentro das camadas conservadoras e limitadas de vista da sociedade portuguesa.

E na verdade, o que é que o Estado cumpre em função por limitar o casamento a pessoas de sexo diferente? E que legitimidade tem em duvidar da capacidade funcional de uma família monoparental ou biparental, de sexos iguais ou diferentes, quando mantém instituições arrastadas de maus exemplos de boa educação, e por reformar, como a Casa Pia ou a Obra do Padre Américo? E se imaginarmos que, e é verdade, que este casal de lésbicas, como tantas outras por rotina, decidem por educar filhas biológicas de uma delas -e é tão fácil - contra o pressuposto generalizado que esta gente não deve sequer ter direito a adoptar? Com que lata teria o Estado de as retirar de um seio (ou 4 pares deles), sem violência física e psicológica, e metê-las no turbilhão das instituições da sua Segurança Social? E se assim é, porque é que ainda estamos sequer a discutir a legitimidade do casamento e da adopção por casais do mesmo sexo num país europeu e moderno como o nosso?

Contra qualquer reaccionarismo que se levante, a família é um conceito mais sentimental e ilógico que a burocracia e os requisitos de procriação. E tanto é que São José foi pai de Jesus Cristo, nascido por estas alturas, e segundo a liturgia sem fazer parte da feitura pelos vistos, nem sequer com direito a consolação de outras vontades para lá das tábuas e dos pregos. Exemplo este sim da família cristã que, na minha ingenuidade, é sobretudo amor e dádiva incondicional e não formatos estandardizados tipo retrato cumprido a frio. A tal família é um lugar de transmissão de valores, de respeito sobretudo, pelos outros e em essencial pela vida e condição humana, berço de cidadania e de laboratório de afectos, e nunca lugar de imposição de conceitos e preconceitos, de alvos ou posições sexuais. É nisso mesmo, nas suas formas diversas, meio de transmissão de amor.

E no conforto do espírito que me rodeia, bomzinho que me venho tornando: um Bom Natal a todos os meus esforçados leitores e um abraço especial à Teresa e à Helena pelo esforço em emendar um Código pouco Civil, contra a negligência política.

[imagem modificada do presépio de St. Agnes, em espelho pelo septo nasal do anjoo : perdoem-me a blasfémia]

8 comentários:

  1. O Código Civil inclui a lei nr. 7/2001 que regula as Uniões de Facto, comparando-as em muito, ao matromónio -- independentemente do sexo. A adopção de crianças por duplas de gays não existe em países como a França, a Alemanha e a Itália (por exemplo) e é inegociável.

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  2. Mais um excelente texto. A orientação sexual não pode ser motivo de discriminação tanto no casamento como na adopção. O conceito de família mudou.Duas lésbicas podem ser muito melhores mães que meninos sós na casa pia.

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  3. Caro Orlando, o matrimónio que fala é certamente o católico e sacramental. Isto é casamento civil e não há direito sequer a comparações no que é justo e que é providencia-lo a 2 cidadãos que o decidam fazer. É direito e ainda não vi em que isso possa atrapalhar a vida dos casais heterossexuais. Agora também me pode dizer o porquê de barrar o direito de adopção (ora lá está: direito) a casais homossexuais, para não falar em famílias monoparentais. É que há uma coisa que tem de aceitar, se isso existe (em mulheres que livremente queiram ser "inseminadas" por um amigo)porque não acabar com a hipocrisia da restrição?

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  4. Há que separar o trigo do joio. Matrimónio é uma união entre duas pessoas de diferentes sexos na (até diria exclusivo) religião Católica Cristã. A união de facto cível, também conhecido como casamento, essa sim poderá, e deve, ser alterada para que abarque o casamento de homossexuais. E vou mais longe, porque não também abarcar casamentos com mais que duas pessoas, assim os árabes também estariam totalmente legalizados em Portugal. Aliás porque não me posso casar com duas mulheres?
    Em relação à adopção à adopção de crianças por homossexuais abstenho-me porque ainda não tenho uma opinião formada. Mas tenho receio que as crianças adoptadas por homossexuais sejam motivo de chacota na sociedade. Não ponho em causa a adopção por homossexuais, mas sim como a sociedade poderá tratar essas crianças, criando problemas. Por exemplo imagine-se uma criança adoptada por um casal homossexual, esta é motivo de chacota na escola pelos colegas, a criança poderá ganhar raiva aos pais, pondo a relação pais e filho em causa. São situações que precisam de ser debatidas.

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  5. Caro César.

    O Casamento entre várias pessoas, a poligamia comum entre muçulmanos e mórmones, não é contemplado por lei. Ora a discussão também se impõe uma vez que temos comunidades entre nós.

    Quanto às crianças:
    . Ou sejam gordas, ou tenham as orelhas grandes, elas são sempre alvo de chacota na escola... Eu que o diga...

    Por outro lado, um casal que opte por adoptar irá fazê-lo em comunidades/cidades onde possam ter as melhores condições: melhores ordenados, condições de vida e lazer, pais mais preocupados com a sua vida que a dos outros...

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  6. Nada contra...mas para teres duas Marias, tiveste de por por detrás dois burros. Da mesma maneira que se fossem dois S. Josés terias por detrás duas vacas.

    isto poderá ter muitas leituras...


    Um abraço e feliz Natal

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  7. :D já tinha tido essa leitura... muito bem apontado. mas pronto, o Menino também saiu ciclope.

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  8. Eu aceito a homosexualidade mas não me peçam para a entender. Criar crianças qualquer ser com humanidade, carinho, amor e compaixão o poderá fazer. Não rotulem pelos padrões socialmente aceitáveis coisas que não tem discussão. Chamem a estes pares de apaixonados o que quiserem (até podem procurar um anglicanismo) mas não utilizem os chavões sociais da família, casamento etc.
    O ser aceite socialmente não significa partilhar a mesma numenclatura.

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