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[Avenida do Mal] Bebés Proveta em Posição de Missionário

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A nova lei de Procriação Medicamente Assistida (PMA) é, na sua necessidade, um espelho imenso de hipocrisia. Admiro-me até porque foi defendida e votada favoravelmente pelo Partido Socialista e Bloco de Esquerda, tão pouco dados a isso- diriam - que aquando do Referendo da Interrupção Voluntária da Gravidez se manifestavam contra a impostura de muitos do Não em relação ao problema. Mas aqui, é a vez de eles se borrarem de vergonha pernas abaixo com tal falta de visão das coisas.

Não comentando ou criticando o restante conteúdo do documento, porque tão pouco o li exaustivamente, diga-se que logo no Artigo 6º se viola um princípio constitucional de igualdade. As únicas beneficiárias serão mulheres casadas, e bem casadas, com 2 anos de cumprimento do contrato em matrimónio, nos seus critérios tradicionais e portugueses. De fora ficam, portanto, casais de lésbicas ou heterossexuais em segura, estável e legal união de facto, ou simplesmente uma mulher solteira que queira ter um filho. Terão de se ficar pelos gatos porque, surpreendentemente, vigora a lei vaticana do modelo de família cristã como único nicho favorável de procriação e educação. Só falta mesmo um capelão na Clínica de PMA.

Mas a palhaçada não se fica por aqui, neste país de salazares costumes fica salvaguardado o sagrado ventre como carimbo de maternidade, quase como Maria incubadora das vontades divinas e portanto mãe nem que não queira. No Portugal de Esquerda bíblica, escreve-se no artigo 9º deste novo testamento, na alínea 3, que "a mulher que suportar uma gravidez de substituição de outrem é havida, para todos os efeitos legais,como a mãe da criança que vier a nascer". Não há lugar, portanto, para úteros de aluguer - só para não misturar "barriga", nas suas tripas e orgãos anexos. Mãe que é mãe, não é a do óvulo, é a do útero. Por conseguinte, basta carregar o rapelho nos 9 meses para ficar com o legal direito de maternidade. Enfim, mais uma perspectiva homúncula da coisa, de homem semeador e mulher como terreno fresado. Não há lugar para a origem da herança genética materna. Só questiono quem terão sido os conselheiros médicos ou científicos de Maria de Belém Roseira e afins...

Neste país de caretos e caras-de-pau, continua-se a ignorar a realidade de quem tem a sorte (ou o azar) biológico de procriar facilmente. Isto porque, muito naturalmente, qualquer mulher solteira, ou em relação com outra, pode voluntariamente ser inseminada num país ao lado numa simples noite de engate com fins meramente procriativos (como o Deus católico manda). Ou então pelo amigo homossexual - quem sabe e para o mal dos pecados de César das Neves ou João Miranda - que também queira deixar os seus genes heptacolores e a sua cultura a gerações futuras e que (ainda) não o pode fazer com o seu companheiro. Blasfémias tais neste país em que por lei nem a Prostituição existe.

Na lei de PMA era só considerar que há quem o possa fazer sem atender às exigências artigo 6º da mesma lei e portanto alargá-lo a quem o desejasse. O direito à PMA é um direito de saúde como qualquer outro num país democrático com ou sem Serviço Nacional de Saúde universal, tal e qual como o da IVG... Mas para o PS e BE, parece que não...

Fico portanto, extremamente irritado com esta esquerda portuguesa laica e liberal (de costumes) que continua a negar o que lhe passa à frente dos olhos. Diz-se moderna e embarca nesta lenga-lenga paternalista que eu achava exclusiva de alguma (muita) direita, alimentando o desprezo pela determinação e pelas decisões conscientes e responsáveis das pessoas em relação à sua vida. É só mais um exemplo parido de um sistema de híbridos ideológicos que só adia o país e a sociedade.

6 comentários:

  1. Como é que votou o CDS, PSD e PCP/PEV? Apresentaram alternativas?

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  2. José Manuel Faria. A questão nem é a posição dos outros partidos porque deles não esperava melhor. Mas, não é por não haver alternativas à lei que se desculpa uma abordagem tão franciscana. Aliás, o PCP/PEV e outros 8 deputados do PSD votaram também a favor, mas dos comunistas são conhecidas as suas posições ortodoxas nesta matéria e em outras respeitantes às liberdades individuais. Surpreendeu-me apenas como é que o BE e o PS, aparentemente mais liberais nesse aspecto, fizeram a lei tão restrita e desfazada da realidade.

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  3. Tem toda a razão, já li a Lei da PMA.

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  4. Isto é um exemplo de confusão prática da insípia ideologia que reina nos partidos.
    Defendem os ideais no papel mas na prática trocam-nas pelas conveniências.
    Cada vez mais se deve dar o papel a independentes que saibam cruzar os seus ideais com as conveniências sãs.

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  5. é por posts como este que linkei este blog. por todas as discordâncias que coloque a alguns dos posts que cá surgem, é por posts assim claros que louvo a avenida central.

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  6. Cada vez fico mais fã deste post ;)
    Muito bem...
    LSC

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