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Capítulo 7: sagrado bairro

Ontem, num telejornal, uma peça mostrava uma mãe indignada. Dizia a senhora que a polícia lhe tinha entrado em casa adentro à procura de armas, mas que não tinham encontrado nada. Pudera, ao que esta mãe afirmava: “a única arma que os meus filhos têm é a bíblia sagrada”.

Vivemos no tempo das tribos, como diria Maffesoli. Ressurgem os mitos e afirmam-se novas religiosidades e o melting pot da era da globalização ajuda à complexificação da estratificação social. A tradicional estratificação social vertical já não é suficiente: a sociedade dos nossos dias estratifica-se na horizontal, apoiando-se não apenas nos factores económicos, mas cada vez mais em factores culturais.

Em Portugal, os pobres já não são apenas pobres. Há pobres portugueses, pobres luso-africanos, pobres luso-ucranianos, pobres ciganos. São todos iguais na pobreza económica, mas vincam a diferença na riqueza cultural. Os pobres olham os outros pobres como pobres de espírito, enquanto os ricos olham os pobres como se fossem todos iguais.

As disputas armadas por território e controlo dos negócios ilícitos não são puro capricho e divertimento: luta-se pela sobrevivência. Os bairros sociais não são uma selva ou o faroeste, como lhes chamam tantas vezes, mas são arrogantes tentativas de padronizar os pobres e afastá-los dos circuitos sociais dos menos pobres.

Ora, se logo nas políticas sociais surgem os primeiros traços de marginalização, não podemos esperar que a inclusão seja pacífica e espontânea.

7 comentários:

  1. Caro João,

    A pobreza tem sido utilizada como arma de arremesso político. No entanto, a política de subsidiação da pobreza está completamente falida uma vez que faz com que os pobres se acomodem à situação e vivam à custa do trabalho dos outros.

    Por outro lado, ainda não encontrei respostas para lidar com os pobres que não querem trabalhar, que se sustentam com os subsídios do Estado e que, enquanto isso, possuem as consolas de jogos mais avançadas, os LCD's mais potentes e os telemóveis mais caros...

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  2. Caro Pedro Morgado,

    Na sua segunda afirmação, apresenta um argumento tão erróneo como generalista. Generalizas e tiras conclusões, de tão bruscas e demagógicas, que atinge o insulto.

    Vejamos, nesta afirmação (...)No entanto, a política de subsidiação da pobreza está completamente falida uma vez que faz com que os pobres se acomodem à situação e vivam à custa do trabalho dos outros.
    , além de demonstrar a sua ideologia mãe, partindo que, se o antecedente for verdadeiro (isto é, a política de "subsidiação" da pobreza estiver falida) consideras (o que é insultuoso), generalizando (incluindo todos os pobres), que o efeito desta política será a acomodação (generalizada) de preguiçosos e "parasitas sociais" (por outras palavras, adequados a certas ideologias).

    Falando em números, que dos cerca de 10 milhões de pobres em Portugal (segundo as tuas palavras: preguiçosos devido a políticas falidas) apenas 334 mil auferem do RSI. Isto, se considerarmos apenas este rendimento (que é o mais criticado pela direita política). Logo, generalizar pobreza com "subsídio-parasitagem" é um erro.

    Este problema (a pobreza) social e socialmente transversal é complexo e cumulativo de várias más políticas (e factores). Esta generalização peca por toda. Deveras insultuosa e um cliché que, sem fundamento, empesta as opiniões de muito boa gente. São apenas tristes e populistas considerações.

    Quanto ao segundo parágrafo, não saberás nem possivelmente haverá uma fórmula mágica e instantânea para resolver o problema dos preguiçosos e parasitas sociais. Mas, e isto tenho a certeza, não é com preconceitos e generalizações que encontrarás tais clarividentes respostas.

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  3. Caro Marco Gomes,

    Aceito a opinião de que a generalização é abusiva e onde se lê "os pobres" deve ler-se "alguns pobres". E isso é bem claro e evidente pela leitura do segundo parágrafo.

    Acresce que a leitura do que tenho escrito sobre estas matérias poderá elucidá-lo sobre as minhas opiniões, sendo desnecessário apegar-se a um lapsus linguae para me empacotar numa qualquer ideologia.

    Seja como for e tal como tenho escrito, o que me preocupa na subsidiação da pobreza são os pobres perante o Estado e lordes perante a vida.

    Por outro lado, não há nada de populista em criticar a subsidiação da preguiça. Aliás, o populismo alimenta-se dessas e doutras benesses, desde as viagens a Fátima até aos frigoríficos, passando, claro está, pelos subsídios.

    Já o escrevi em Julho e mantenho:
    Com a crise a bater à porta, os dois principais partidos parecem apostados em taxar a classe média trabalhadora para distribuir subsídios não só aos indigentes, mas também aos que continuam a fugir aos impostos, sendo pobres perante o Estado e lordes perante a vida.

    O problema desta fórmula é que a crise vai adensar-se e a classe média há-de fartar-se do desfilar de medidas completamente ineficazes para o equilíbrio dos seus orçamentos familiares. E tanto a corda estica que algum dia há-de quebrar.


    Abraço

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  4. Tema crucial, este da pobreza que, às vezes, serve de arma de arremesso, entre pobres políticos.
    Vejo, João Martinho, que tem formação e informação aprofundadas acerca do assunto.
    A pobreza, a que eu gosto mais de chamar exclusão social, são realidades muito complexas que se não podem arrumar com duas pinceladas, como alguns pretendem. Ainda bem que puxa a reflexão para o lado da seriedade.
    Os bairros sociais, os rendimentos de inserção, são, ou foram, tentativas de resposta ao problema que precisam de ser reinventados. Querer ou não querer trabalhar é, também, uma questão multifacetada. Também há economistas que acham que os rendimentos mínimos são soluções baratas de coesão social. E estou a falar de economistas que não mostram preocupações sociais mas económicas e nem são de esquerda.
    Portanto, chovam ideias realistas para combater a praga.

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  5. Antes de mais, obrigado aos três pelos comentários.

    Pedro,

    Considero a tua generalização mais grave que o problema que apontas. Notei que a tentaste emendar, mas continuaste a insistir na necessidade de punir os "pobres perante o Estado e lordes perante a vida". Pelo que percebi dos teus comentários - não recordo os posts que citas -, consideras que possuir os melhores telemóveis, as melhores consolas e, enfim, tecnologias de ponta assegura a riqueza. Por outro lado, se não dizes que os bens garantem a riqueza, poderás dizer que garantem o estatuto de "rico".

    Ora, com a proliferação dos créditos fáceis e imediatos, todos podem parecer lordes perante a vida. E aqui está uma questão bastante importante: ser e parecer são coisas muito diferentes. Para ter as melhores roupas, os melhores carros, os melhores móveis, etc., os pobres têm de abdicar de outras coisas, provavelmente mais importantes. Mais: há muita gente que prefere - insisto: prefere - parecer do que ser, mas não o consegue à custa dos subsídios, consegue-o à custa de opções pessoais que são, invariavelmente, privações pessoais.

    Concordo contigo que a solidariedade não pode ser um fim em si mesma; sou contra o dar por dar. Acredito que mesmo aqueles que não podem trabalhar, podem contribuir para a sociedade, ainda que este contributo se limite à comunidade em que está inserido. Aliás, já que falámos de bairros, penso que deveria ser promovido o associativismo também nos bairros: afinal, se todos somos cidadãos, todos merecemos ter voz. Acredito que os subsídios seriam bem empregues como paga de trabalho comunitário; e que se assim fosse, até deveriam ser aumentados.

    Só mais uma coisa: achas que os pobres de que falámos compram os melhores telemóveis, os melhores televisores ou as melhores consolas com o dinheiro dos subsídios?



    Fernando,

    Tenho dúvidas de que os dois conceitos (pobreza e exclusão social) signifiquem a mesma coisa. A pobreza é uma condição e pode conduzir à exclusão social, mas não é, concerteza, o único factor de exclusão social.

    Como dizia no meu texto, considero que o conceito de pobreza sofreu algumas transformações nos últimos anos e os pobres "padrão" de ontem são pobres "diversos" hoje. Ora, se os pobres são diferentes entre si, também a exclusão social a que poderão estar sujeitos será também num grau diferente.

    Para além desta ideia, poderemos questionar ainda o que é, de facto, a inclusão social.
    a) Se falámos de "integração" na cultura maioritária, os pobres "nativos" estarão, em princípio, mais "incluídos" que outros pobres das minorias culturais.
    b) Se falámos de "miscigenação cultural", estarão todos (pobres e ricos) equidistantemente longe dessa utopia; afinal, se o mundo fosse perfeito não tínhamos pobres nem ricos.

    Perdoe-me o uso excessivo de aspas, mas caminhámos em terreno minado ao falar destas coisas e não podemos permitir que as palavras sejam lidas - e entendidas - de ânimo leve.

    Em relação aos subsídios, a minha opinião está brevemente descrita na resposta ao Pedro, mas terei muito gosto em prolongar a discussão.


    Cumprimentos a todos.

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  6. JOÃO MARTINHO:
    Agradeço a correcção que faz sobre os termos que utilizei. Tenho bem presente estar em diálogo com um sociólogo. obrigado.
    Mas gostaria de continuar no debate pobreza/exclusão. Sobretudo fazer perguntas:
    - A pobreza é, sobretudo, uma questão económica?
    - É um simples "não querer" trabalhar?
    - Não será, a pobreza, uma doença "do querer"?
    Eu conheço muitos pobres que são alcoólicos crónicos, toxico-dependentes, esquizofrénicos, autistas, velhos, jovens analfabetos(!), crianças, mães analfabetas ou analfabetas funcionais com ranchos de filhos e com os maridos na cadeia, deficientes físicos com anomalias psíquicas,doentes das sidas, das hepatites, etc.
    Conheço, também, muitas pessoas que estão como que "contagiadas" psicologicamente por este cenário de fundo porque vivem em guetos de pobreza, i.é., em ambientes de "cultura" de pobreza. Com estas pessoas podia-se fazer mais um pouco...
    Então, o que fazer?
    Para mim nada há de mais repugnante do que ouvir alguém dizer, lá de cima e diante desta tremenda realidade: "Eles não querem é trabalhar", ou "vai trabalhar, malandro" É um discurso que vende bem mas não ajuda mesmo nada a melhorar a situação.

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  7. Caro João Martinho,

    Se as pessoas fazem empréstimos para além das duas possibilidades eu não tenho que pagar essa falta de juízo. Porque hão-de obrigar-me a viver abaixo das minhas possibilidades para outros viverem acima das suas?

    Isto é coisa bem diferente de desenvolver políticas que favoreçam a ascensão social, através de um sistema educativo inclusivo, por exemplo. Ou de políticas que permitam às pessoas que se encontram em situação difícil do ponto de vista económico reestruturar as suas vidas. Ou de políticas que garantam saúde, educação, segurança e justiça para todos.

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