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O Engodo

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Maria de Lurdes Rodrigues
© Miguel A. Lopes

Há duas formas elementares para aumentar o sucesso escolar - diminuir os níveis de exigência ou aumentar a qualidade da formação.

Quando se opta pela primeira solução, contribuiu-se para a degradação do ensino numa espiral de sucessivo facilitismo. O sucesso escolar converte-se num fim em si mesmo e, ao contrário do que possa pensar-se, o incremento artificial desse sucesso não é um promotor de igualdade e integração nem um motor para a economia do país. Pelo contrário, constitui-se como um terrível empecilho ao desenvolvimento social, acarretando o ónus de gerar falsas ilusões nos jovens estudantes e nas suas famílias.

Façamos o exercício meramente teórico de imaginar o que sucederia se uma escola médica decidisse aumentar o sucesso escolar dos seus alunos pela mesma via que foi seguida pelo Ministério da Educação. Primeiro facilitavam-se os testes de Farmacologia e deixava-se de se exigir que os alunos conheçam os grupos farmacológicos. Depois tentava-se resolver o problema da Anatomia e as avaliações passavam a perguntar coisas tão básicas como quantos estômagos temos?. Finalmente, dispensavam-se aos alunos de saber manter uma conversa coerente com os seus pacientes. No fim de tudo, teríamos uma escola médica absolutamente exemplar do ponto de vista do sucesso académico, mas teríamos hipotecado o compromisso social de formar médicos competentes.

Por via da mentira repetida à exaustão num registo de indignada vitimização, Maria de Lurdes Rodrigues e respectiva horda de seguidores convenceram a esmagadora maioria dos portugueses de que os esforços empreendidos pelo seu Ministério conduziram a uma efectiva melhoria dos conhecimentos e das competências dos alunos na disciplina de Matemática. Isto sucede porque a mediania do país, reflexo da mediania da Escola das passagens políticas e administrativas, não lhe permite perceber o tamanho da ficção dos resultados apresentados. No entanto, a honestidade e o bom senso políticos recomendam que as preocupações relativamente aos maus desempenhos dos alunos nas disciplinas nucleares - Matemática e Português - se mantenham inalteradas apesar do milagre estatístico operado nos corredores do Ministério da Educação.

A situação a que chegámos é altamente confrangedora. Nos dias que correm, um aluno chega ao ensino superior sem conhecer as noções matemáticas mais simples, sem nunca ter abordado temas tão básicos como ligações covalentes, sem imaginar quem se senta na Assembleia da República e, pior que tudo, sem ter a mínima noção do tamanho do desconhecimento.

E não há xoque tecnológico que nos valha...

8 comentários:

  1. Não é de agora. Já há anos que chegam alunos ao ensino superior «sem ter uma mínima noção do tamanho do desconhecimento», mas ainda assim saem de lá formados e prontos a dar aulas. Claro que muitos nem chegam a ver as salas de aulas, já que nunca foi reajustado o número de vagas, conforme a oferta... mas existem sempre aqueles que o conseguem, pois há sempre quem se reforme. Pergunto-te uma coisa: se durante 12 anos não se apreende "nada" a culpa é só dos sucessivos Ministérios, ou não terão os professores - independentemente do programa em vigor - uma dose considerável de culpa? Há muitos mais maus e medianos professores do que bons... No fundo, acaba por ser inconsequente a discussão da dificuldade dos exames no 12º ano, se foi durante os 12 anteriores que a coisa correu mal.

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  2. "Há duas formas elementares para aumentar o sucesso escolar - diminuir os níveis de exigência ou aumentar a qualidade da formação."



    O autor deste texto coloca o dedo na ferida.

    Mas convenhamos que o simples facto de se aumentar o nível das médias no ensino superir não implica por si só maior qualidade por parte dos alunos.
    O autor deu o exemplo dos alunos de medicina mas não se pode esquecer que estes indivíduos são aqueles que apresentam o maior nível de falta de vocações para o exercício da profissão.
    A exigência em alcançar médias altas afastam-nos do mundo real durante a fase mais importante da vida deles, ou seja, a adolescência. Podem ser grandes matemáticos ou peritos em física e quimica mas como homens e mulheres, muitos deles, falham redondamente.E pode-se dar o expemplo para outras áreas profissionais.


    p.s. já repararam que a principal característica deste blog está a definhar? A participação dos leitores desceu drasticamente e corre-se o risco de se tornar em mais um daqueles blogs onde se fala para as estrelas.
    É pena...

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  3. JLS, pode ter certeza que com as actuais políticas deste Ministério, os bons professores que havia deixarão de o ser, incapazes de lutar contra esta balburdia que os desautoriza e os obriga a transformarem-se em meros técnicos.

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  4. Caro manuel,

    Obrigado por expressar de forma tão directa a sua opinião relativamente à restrição de comentários a utilizadores registados.

    Contudo, penso que ainda é cedo para balanços e o facto do número de subscritores por e-mail ou feeds ter aumentado é um excelente indicador.

    Seja como for, o nível da discussão aumentou sobejamente e o ruído de fundo diminuiu. A qualidade dos comentários tem sido altamente compensadora e os e-mails que tenho recebido também aumentaram.

    Cumprimentos (e bons comentários),
    Pedro Morgado

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  5. Tudo isto também tem a ver com as modas da gestão por objectivos...
    Traça-se um objectivo, mesmo irrealista, e depois pressiona-se o seu cumprimento como bandeira eleitoral...
    Lamentável!Assim também eu sou bom a matemática...Alguém acredita ( O José Lello acredita...)que uma melhoria de 50% nas médias em matematica do 12ºano é estruturante da melhoria do conhecimento das matérias?
    Bom, mas uma boa medida da Ministra da Educação era afrontar o lobbie das acumulações de emprego no professorado do ensino secundário, bem como das explicações selvagens...
    Um professor vai do emprego público para o emprego privado e depois para as explicações enquanto outros professores recem licenciados nada têm...
    É um escândalo o que se passa nesta matéria e ninguém diz nada...Nem os Sindicatos, claro...
    Eu que sou por eles, verifico que de facto não afrontam este sistema em nome daqueles que querem chegar ao ensino e não entram...
    Percebo: é que perdiam pau e bola...

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  6. Eu cheguei à faculdade sem saber o que são ligações covalentes (nem hoje sei... nem quero saber). E desfio que nao sabia quem se sentava da Assembleia da Republica. Nao me fez mal! Nao acho que esse seja o problema e acho que anda aí muita critica sem fundamento objectivo.

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  7. Transmitir imagem de sucesso, nem sempre dá resultado...os Portugueses entenderam bem e compreenderam os numeros divulgados e os comentários de especialistas! Enfim mais uma reforma à espera de reforma...facilitismo pode sair caro no futuro, entretanto apenas num curto espaço de tempo, o Governo aparece satisfeito com os resultados obtidos apenas num Ano.Tudo cor de rosa.

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  8. Transmitir imagem de sucesso, nem sempre dá resultado...os Portugueses entenderam bem e compreenderam os numeros divulgados e os comentários de especialistas! Enfim mais uma reforma à espera de reforma...facilitismo pode sair caro no futuro, entretanto apenas num curto espaço de tempo, o Governo aparece satisfeito com os resultados obtidos apenas num Ano.Tudo cor de rosa.

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