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[Avenida do Mal] Serviço Nacional de Mezinhas

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Os leitores que me perdoem o devaneio (esperariam leituras mais responsáveis), finado que está o mandato a Correia de Campos mas tão pouco nos parece das políticas para a Saúde, algumas (se não quase todas) lhas gabo pelo carácter reformador e corajoso (aberto surpreendentemente às vezes e se calhar arreganhado demais), mas claro - como não podia deixar de dizer que é moda - a roçar a arrogância. Mas nele como na Ministra da Educação, talvez tivesse [a arrogância como tempero] vindo de cima, forçada pela lava que lhes cobriu e arrefeceu neles, expelida pela stromboliana figura do nosso primeiro. E Paulo Portas que se queixe, por muito que se esperneie no ridículo de uma barata sem cabeça e às turras por restos que nem por onde saberá meter, nesta República e neste Regime, quem sabe neste Universo.

Voltados ao assunto proposto, escrito como fluxo delirante de jocosidade, qual Cabala qual quê, e outra piada daria a este país com muita falta de humor. [Ou até não: devemos rir que chegue porque apesar das desgraçadas encenações debaixo de barbas e nas nossas costas - como bancos que aumentam o spread e penalizam o cliente só porque os lucros (sim os lucros) não cresceram assim taaaaaaaaaanto... - parecemos resignadamente extasiados] Valerá então perguntar a quem é que mais renderá o fecho compulsivo de serviços de saúde, convencional diga-se (e vão já perceber porquê), por esse país abaixo e acima, sobretudo no país rural, entre o xisto e as casas tipo maison, abandonadas 11 meses por ano, ao mofo e à poeira, jardins de silveiredo e chafariz com pilinhas cheios de musgo e lodo.

Eu diria – e em consequência de um escrito de Pedro Romano, mas ninguém me leve a sério- ao lobby do Padre Fontes, cabeça da Medicina Popular e da Indústria Farmacêutica Tradicional , feitas de mezinhas, cruzes, rezas, coreografias com tenazes e brasas, chás de ervas parideiras, “peidos de velha”, santieiros, ervas dormideiras, infusões e pasteis de mais de quantas partes retiradas a animais e plantas do monte, urzes e torgas (será a mesma coisa), eucaliptos (clipes), alhos, saburgo, casca de cebola, cidreira, erva da tintura e outras que não lhe sei o nome em português que fará noutras línguas mortas.

Trema, pois então, a Medicina convencional de medo: médicos, enfermeiros e administrativos; que extensões de saúde, centros, hospitais às moscas e urjaincias para gente que lhe dói a perna ou não consegue dormir de noite, fechados agora, cedo serão ocupados por bruxas, curandeiros, cartomantes, endireitas, cortadores de mau-olhado, padres exorcistas. Enterrado o Serviço Nacional de Saúde no enterior rasgado por autoestradas - tão caras que são, é como se lhe passassem ao lado - erguer-se-á o Serviço Nacional de Mezinhas, como alternativa e não tarda nada, com ele, a fundação da Ordem dos Feiticeiros, como os seus colégios de Ervanárias, Endireitas, Cartomantes e afins. A Psiquiatria substituída por padres (se calhar outras figuras de aura santa) de bíblia numa mão e Livro de São Cipriano noutra, botando fora rezas ao mau-olhado, a talhar o bicho, a expulsar o Demónio, a ensinar as virgens a levar as mãos aos brincos d’ouro com o toar dos trovões ao longe.

E qual Érri Pótamo qual quê. Vilar de Perdizes é a Hogwards portuguesa e o Padre Fontes o Dumbledore. Vou até ponderar mudar de curso, porque maior respeito por conselhos têm as curandeiras da minha terra. Uma delas, que nem lhe conheço instrução primária (terá com certeza, porque lê um livro grosso e interpreta figuras de Tarot), chamada de "Doutora Glória". Passo a publicidade, mas forçou-me a sua fisionomia simpática. Que no seu "grau académico" mais consolida a suspeita do funcionamento (com entradas por algum lado e requisito) da Academia Perdiziana. E não admira a licenciatura, por ventura, que nos classificados há também Mestres e Professores. Só não conheço gente de Cátedra nem Jubilados, por enquanto, porque outros anúncios nas mesmas páginas saltam mais à vista.

Neste advento de alguma coisa, António Arnaut, o pai nosso de cada dia em que podemos aceder (a preços baratos, porque é tendencialmente gratuito), aos serviços de Saúde do Estado, que se aborreça ainda mais com a total falta de cultura de saúde. Qualquer dia, daqui a uns anos, haverá protestos pelo encerramento de SAP’s de Feitiçaria, ambulâncias do INEM com paus de vassoura em vez de rodas, de fronte ao Ministério da Maleita sob chancela do Professor Alexandrino.

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